Num país com uma das
mídias mais concentradas do mundo, a circulação de mais um diário
impresso já é por si uma boa notícia. Melhor ainda se este diário é o
JORNAL DO BRASIL, retomando uma longa tradição de jornalismo crítico,
análise politica e tribuna de debates.
A imprensa brasileira
teve ao longo da sua história inúmeros exemplos de bom jornalismo e de
coragem editorial, dos quais a trajetória do JORNAL DO BRASIL está
repleta. A edição de 14 de dezembro de 1968, denunciando com
inteligência e sutileza o arbítrio do AI-5; a primeira página sem
manchete (vetada pela censura) de 12 de setembro de 1973, denunciando o
golpe militar no Chile; a trágica imagem do flagelado nordestino com o
calango que tinha caçado para comer; e não posso me esquecer que o JB
foi o único jornal a publicar na primeira página a greve da Scania de
1978, a primeira de uma série que iria mudar a história do Brasil.
São exemplos da ousadia e criatividade que fizeram do JB uma de nossas maiores escolas de jornalismo.
Os
tempos que vivemos, no entanto, exigem uma abordagem extremamente
crítica dos grandes meios de comunicação brasileiros. A democracia não é
o silêncio, mas também não pode se resumir à voz única de uma mídia
concentrada em poucos e poderosos grupos familiares, praticamente
unânimes nas suas posições políticas.
Um jornal sem opinião
seria um jornal sem alma. Mas o que vemos no Brasil é a opinião e a
posição política dos donos da imprensa distorcendo fatos, silenciando e
censurando expressivos setores da sociedade, validando mentiras de
autoridades sempre que lhes convém. Mais de uma vez em nossa história,
os maiores veículos da imprensa atuaram abertamente contra a
democracia. Foi assim em 1954, na campanha de difamações que levou
Getúlio Vargas ao suicídio, e em 1964, dando cobertura ao golpe contra o
governo de João Goulart.
Em 1984, o mais poderoso conglomerado
de comunicação do país, as Organizações Globo, colocou-se mais uma vez
contra a vontade popular, censurando a campanha das Diretas até o
momento em que se tornou impossível vencer a maré das ruas.
Décadas
depois, a Globo falsificou a própria história, para esconder que
censurou as diretas, e pediu desculpas por ter apoiado o golpe de 64,
origem do poder que ela hoje ostenta. Nem a história deixou de ser
história nem a Globo deixou de se envolver em ataques contra a
democracia, como se comprovou na campanha para derrubar a presidenta
Dilma Rousseff em 2016. Em nosso governo, tentamos, mas não
conseguimos avançar num projeto de regulamentação dos meios de
comunicação. Hoje estou mais convencido do que nunca de que o liberdade
de expressão e a liberdade de imprensa têm de ser para todos, não apenas
para os setores da sociedade que detêm os jornais e as concessões de
rádio e televisão. Democratizar o acesso à informação correta e aos
meios de comunicação tornou-se prioridade na pauta democrática do país.
Por isso, saúdo o retorno à circulação do JORNAL DO BRASIL e torço para
que o jornal volte a ser a referência de jornalismo que um dia foi e que
a democracia brasileira tanto precisa.
* Ex-presidente da República