Mostrando postagens com marcador DITADURA NUNCA MAIS. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador DITADURA NUNCA MAIS. Mostrar todas as postagens

Punição aos torturadores. Uma questão de justiça!



Colaboração José Mauro Freitas
Relatório da Comissão Nacional da Verdade relata que crueldade de métodos era intensificada contra mulheres, submetidas a estupros, desnudamento forçado, abortos provocados e separação e tortura dos filhos por parte de agentes do Estado brasileiro


A violência sexual como método de tortura física e psicológica como política de Estado vitimou mulheres e homens durante a Ditadura Militar, constituindo graves violações aos direitos humanos e crimes contra a humanidade. Para elas, entretanto, a crueldade era intensificada pelo fato de serem mulheres. 

Depoimentos das sobreviventes colocam em evidência os múltiplos métodos usados pelos agentes da repressão: estupros, humilhação ininterrupta, desnudamento forçado, abortos provocados, separação dos filhos e tortura contra os companheiros e familiares.

O cenário desumano é detalhado no capítulo “Violência sexual, violência de gênero e violência contra as mulheres e crianças” do Relatório Final da Comissão Nacional da Verdade (CNV), divulgado na última quarta-feira (10/12). O texto utilizou como base a definição de “discriminação contra a mulher” da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (CEDAW), definida como toda distinção, exclusão ou restrição baseada no sexo e que tenha por objeto ou resultado prejudicar ou anular o reconhecimento, gozo ou exercício pela mulher dos direitos humanos e liberdades fundamentais.

Lucia Murat contou em depoimento à CNV em maio ter sido vítima de tortura sexual e que poderia ter provocado sua própria morte caso tentasse se proteger. “Eu ficava nua, com o capuz na cabeça, uma corda enrolada no pescoço, passando pelas costas até as mãos, que estavam amarradas atrás da cintura. Enquanto o torturador ficava mexendo nos meus seios, na minha vagina, penetrando com o dedo na vagina, eu ficava impossibilitada de me defender, pois, se eu movimentasse os meus braços para me proteger, eu me enforcava e, instintivamente, eu voltava atrás”.

Com base em testemunhos como o de Lucia junto a investigações do grupo de trabalho “Ditadura e Gênero”, a CNV constatou que a violência sexual praticada por agentes públicos ocorria de forma disseminada,  com registros que coincidem com as primeiras prisões, logo após o golpe de Estado, constituindo instrumento de tortura e violação dos Direitos Humanos.

“Inserida na lógica da tortura e estruturada na hierarquia de gênero e sexualidade, a violência sexual relatada por sobreviventes da ditadura militar constitui abuso de poder não apenas se considerarmos poder como a faculdade ou a possibilidade do agente estatal infligir sofrimento, mas também a permissão (explicita ou não) para fazê-lo. Foi assim que rotineiramente, nos espaços em que a tortura tornou-se um meio de exercício de poder e dominação total, a feminilidade e a masculinidade foram mobilizadas para perpetrar a violência, rompendo todos os limites da dignidade humana”, descreve o texto.
De acordo com o Estatuto de Roma, citado pelo documento, a agressão sexual, escravidão sexual, prostituição, gravidez e esterilização forçadas ou qualquer outra forma de violência sexual de gravidade comparável constituem crimes contra a humanidade.
Práticas como detenção arbitrária e tortura, por meio de choques nos órgãos genitais, golpes nos seios e no estômago para provocar aborto ou afetar a capacidade reprodutiva, introdução de objetos e/ou animais na vagina e/ou anus e choque elétrico nos genitais foram cometidos contra as mulheres presas em diversos locais: DEIC, DOI-CODI, DOPS, Base Aérea do Galeão, batalhões da Polícia do Exército, Casa da Morte (Petrópolis), Cenimar, CISA, delegacias de polícia, Oban, hospitais militares, presídios e quartéis. A violência sexual nesses locais era empregada como arma.
As mulheres, militantes ou não, incluindo religiosas, eram tidas como merecedoras de violações pelos militares, formados numa ótica sexista e homofóbica. Para as militantes, porém, a situação se agravava. Contra elas a tortura também era empregada para arrancar delações sobre namorados, maridos e companheiros. Entre os casais presos, era comum que a mulher fosse violentada na frente do parceiro, imobilizado no pau de arara e também vítima de violência.
Márcia Bassetto Paes relatou ao CNV a tortura sofrida quando foi presa com Celso Giovanetti Brambilla pelo Deops/SP, em 28 de abril de 1977. “Na questão da mulher, a coisa ficava pior porque… quer dizer pior, era pior para todo mundo, não tinha melhor para ninguém, né? Mas [...] existia uma intenção da humilhação enquanto mulher. Então, o choque na vagina, no anus, nos mamilos, alicate no mamilo, então… eram as coisas que eles faziam. Muitas vezes, eu fui torturada junto com Celso Brambilla porque a gente sustentou a questão de ser noivo. Eles usaram, obviamente, essa situação, esse vínculo, suposto vínculo, além da militância, que seria um vínculo afetivo também, para tortura”.
A maternidade também era usada como instrumento de desestruturação das mulheres. Ameaças aos filhos recém-nascidos, injeções para cortar o leite das lactantes e separação compulsória das crianças eram frequentes. “Mutilações nos seios privaram mães de amamentar seus bebês. Úteros queimados com choques elétricos tornaram muitas mulheres incapazes de engravidar ou de levar adiante uma gestação”, revela o documento.
Com menos de dois anos de idade, a filha de Eleonora Menicucci de Oliveira, atual ministra chefe da Secretaria de Política para as Mulheres da Presidência da República, então militante, foi ameaçada pelo uso de choques elétricos, por Lourival Gaeta. “Um dia, eles me levaram para um lugar que hoje eu localizo como sendo a sede do Exército, no Ibirapuera. Lá estava a minha filha de um ano e dez meses, só de fralda, no frio. Eles a colocaram na minha frente, gritando, chorando, e ameaçavam dar choque nela. (…) Até depois de sair da cadeia, quase três anos depois, eu convivi com o medo de que a minha filha fosse pega”.
Muitas vítimas fatais da ditadura foram submetidas à violência sexual antes de desaparecer ou de serem assassinadas. Foi o caso de Anatalia de Souza Melo Alves, que teve os órgãos genitais queimados, antes de sua morte, em janeiro de 1973, no local em que funcionava a Seção de Comissariado da Delegacia de Segurança Social da Secretaria de Estado dos Negócios de Segurança Pública, em Pernambuco.

O relatório aponta também as marcas permanentes deixadas nas mulheres que sobreviveram à tortura: medo, vergonha, angústia e interferência nas decisões sobre os rumos para a própria vida.
“O fato de os crimes terem sido cometidos por agentes públicos encarregados de proteger a sociedade, a vida e a integridade física de seus cidadãos os fez aumentar o sofrimento da maioria dos sobreviventes, que ainda hoje padecem ao lidar com o estigma em torno dos crimes sexuais, a indiferença da sociedade e a impunidade dos violadores”, aponta o documento.

Essa é a realidade de Cristina Moraes Almeida, presa pela primeira vez aos 19 anos, em 1969. Nas sessões de tortura, sofreu mutilações na região do tórax e nos seios e teve a perna estraçalhada por uma furadeira.

“Eu quero esquecer. Mas eu te pergunto: qual é o profissional, na Psicologia, que vai apagar essas marcas? Não tem. Não tem. E hoje em dia eles [torturadores] dizem: ‘eu não sei, eu não vi, não me comprometa’. Olha, tacharem como torturador é um elogio. Assassino em série, sem sombra de duvida. [...] Eu quero sair deste capítulo. Porque eu estou vivendo como se fosse ontem”.

A feminista Maria Amélia de Almeida Teles, a Amelinha, foi presa na Operação Bandeirante (OBAN) com o marido, César, em 1972, quando era militante política. Na prisão foi torturada e teve a maternidade usada contra ela ao ter suas crianças, Janaína e Edson, raptadas na Operação Bandeirante e levadas à sala de tortura para presenciar a violência sofrida pelo casal na prisão. Ao ver o lançamento do relatório final da CNV ela espera que a justiça seja feita para as vítimas.

“O estupro era usado largamente. Muitas mulheres foram estupradas e diria que as que foram assassinadas ou estão desaparecidas tiveram a violência sexual como forma do inimigo, “o Estado”, de se declarar dono do corpo dela, com poder político e social sobre ela. 

Durante a ditadura Militar, foi grande o número de depoentes vítimas que denunciaram os estupros e nós do movimento feminista entendemos que o estupro praticado por um agente do estado em pleno exercício da sua função como uma ação repressiva deve ser considerada uma violação de direitos humanos e crimes de lesa-humanidade, portanto, crimes imprescritíveis que devem ser devidamente punidos como previsto pelos tratados internacionais”.

A revolução dos Caranguejos


Já que o Alto Comando Militar insiste em chamar isso que aí está de Revolução – sejamos generosos: aceitemos a classificação. Mas devemos completá-la: é uma Revolução, sim, mas de caranguejos. Revolução que anda para trás. Que ignora a época, a marcha da história, e tenta regredir ao governo Dutra, ou mais longe ainda, aos tempos da Velha República, quando a probidade dos velhacos era o esconderijo da incompetência e do servilismo. Quando até os vasos de nossos sanitários, as louças de nossos mictórios públicos tinham o consagrador made in England.
O Brasil foi para a frente, ganhou campeonatos do mundo, firmou uma presença industrial, subiu ao plano internacional – mas tudo isso é fruto do comunismo: há de regredir aos tempos da Baronesa, Leopoldina Railway, das tesourinhas Sollingen, do retrato do Santo Padre concedendo indulgências plenárias pendurado nas salas de visita.
Lembro o poema de Apollinaire sobre o caranguejo: “recuamos, recuamos”. E a sensação que predomina no País é esta: um recuo humilhante que deverá ser varrido muito mais cedo do que os medrosos e os imbecis pensam. Não se podia esperar caráter e patriotismo dos políticos: são coisas que a estrutura de um político não pode possuir, assim como a estrutura do concreto armado não pode possuir bolsões de ar. Mas dos militares – não há como negar, sente-se patriotismo e algum caráter. Um patriotismo adjetivado, sem substantivos, que se masturba com os gloriosos feitos históricos, feitos cada vez mais discutíveis. Um patriotismo estéril, que não leva a nada, que não constrói nada: lembro a patriotada do marechal Osvino mandando que os postos de gasolina hasteassem a bandeira nacional. É quase uma anedota, mas é típico da espécie deste patriotismo que rege nossas Forças Armadas.
Com algum caráter e algum patriotismo, é possível que os próprios militares compreendam o mau passo que estão dando, desmoralizando o Brasil perante o mundo inteiro, e, o que é pior, destruindo o que de melhor temos como Nação, e como povo: a vergonha.
Não se compreende que os militares, hoje no poder, em nome da ordem queiram impor tamanho retrocesso. Estúpida concepçã da ordem essa, a de que a ordem se basta a si mesma. A ordem só é válida quando conduz a alguma coisa: ordo ducit. Mas a ordem que os militares desejam é uma ordem calhorda, feita de regulamentos disciplinares do Exército e de estagnação moral e material.
Até agora, essa chamada Revolução não disse a que veio. As necessidades do País, que levaram o governo inábil do Sr. João Goulart a atrelar-se à linha chinesa do comunismo internacional, não receberam uma só palavra do Alto Comando. Falam em hierarquia, em disciplina, e consideram a Pátria salva porque os generais continuarão a receber continência e medalhas de tempo de serviço – à falta de condecorações mais bravas.
Sabemos que o governo deposto, se realmente enveredou o País para o caminho do caos, em parte tinha real cobertura dos anseios populares que o Sr. João Goulart não soube interpretar nem zelar. Esses anseios não desaparecerão porque o general Fulano depôs o general Sicrano. Afinal, o Brasil – já o disse aqui – não é um quartel de oito milhões de quilômetros quadrados. Quadrados são os que desejam fazer do País um prolongamento do quartel.
Sem medo, e com coerência, continuo afirmando: isso não é uma revolução. É uma quartelada continuada, sem nenhum pudor, sem sequer os disfarces legalistas que outrora mascaravam os pronunciamentos militares. É o tacão. É a espora. A força bruta. O coice.
Que os caranguejos continuem andando para trás. Nós andaremos para a frente, apesar dos descaminhos e das ameaças. Pois é na frente que encontraremos a nossa missão, o nosso destino. É na frente que está a nossa glória.

Carlos Heitor Cony
dia 3 de abril de 1964

Todos lá!


Manifestações foram ocupadas por extrema-direita brasileira, diz professor da PUC

Cooptação

Jurista Pedro Serrano afirma que o caráter antipartidário da manifestação de ontem representa postura golpista de setores conservadores paulistanos

por Júlia Rabahie, da RBA
Danilo Ramos/RBA
queima bandeira_danilo ramos rba.jpg
Serrano considera "fascista" expulsar bandeiras de partidos, incluindo os que participavam desde o começo
São Paulo – O jurista e professor de Direito Constitucional da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) Pedro Serrano disse hoje (21) que o movimento de manifestações que tomaram as ruas de São Paulo nas últimas semanas, deflagrados pelo aumento das passagens de ônibus, trens e metrô da cidade no último dia 2, foi ocupado pela extrema-direita do país. “As violências que ocorreram ontem demonstram que o movimento vem sendo ocupado por fascistas, neonazistas ou a extrema-direita brasileira, e o problema da direita brasileira, ao contrario da direita europeia e norte-americana é que ela é uma direita que não aceita o processo democrático.”

Na manifestação realizada ontem (20) na avenida Paulista, inicialmente organizada para comemorar a revogação, na véspera, da tarifa das passagens, anunciada pelo governador Geraldo Alckmin (PSDB) e o prefeito Fernando Haddad (PT), bandeiras de partidos políticos foram queimadas e militantes de movimentos sociais foram hostilizados por manifestantes que gritavam frases como “sem partido” e “meu partido é meu país”. O movimento negro Uneafro teve uma de suas bandeiras rasgadas e militantes do movimento feminista Marcha Mundial da Mulheres (MMM) foram agredidos. 

O discurso do apartidarismo, segundo o professor, na realidade esconde um caráter antipartidário e intolerante dos manifestantes. “A direita no Brasil não tem um partido claramente de direita, não participa da disputa social de ideias, não participa do processo democrático de maneira clara. Ela encontra subterfúgios discursivos para justificar atitudes golpistas.” Serrano também criticou o linchamento de partidos políticos e movimentos sociais organizados do ato e a depredação do Palácio do Iatmaraty, em Brasília, durante manifestação que também ocorreu ontem. 

“São atitudes fascistas expulsar bandeiras de partidos políticos, que inclusive estavam desde o começo do movimento participando. Depredar órgãos públicos, inclusive um simbólico que é o Itamaraty, órgão que estabelece mecanismos pacíficos de relação entre os povos. Por trás do apartidarismo e do apoliticismo na realidade há uma postura antiga do Brasil, das nossas elites, que é uma postura golpista contra as conquistas sociais que o processo democrático trouxe ao país, e isso é muito perigoso”, comentou Serrano.

Novas demandas

O Movimento Passe Livre (MPL), responsável pela convocação dos atos pela revogação do aumento das passagens, foi elogiado por Serrano por trazer novas demandas à sociedade e aos governantes em geral. O MPL divulgou hoje em nota que não irá mais participar dos atos que estão sendo convocados pela internet, que levantam bandeiras genéricas como mais educação, mais saúde e o fim da corrupção, e estão trazendo à tona um discurso conservador. O professor da PUC aponta uma crise de legitimidade no modelo político representativo entre os jovens que inicialmente tomaram as ruas contra o aumento. 

“O restante do movimento, o Passe Livre, a gente tem de refletir que eles têm uma demanda adequada. Há um problema de legitimidade da representação no sistemas democráticos do mundo. Quem recebe o mandato público, ao passar a exercê-lo, passa a atender mais a interesses particulares que os interesses de quem o elegeu. Essa meninada se revolta contra isso, e temos de absorver essas criticas , incorporá-las e ver como mudar isso, para poder sobreviver à ameaça à democracia.”

Manifestantes fazem ato contra ditadura militar

Ato incluiu protesto contra governador Sérgio Cabral

 Caio Lima*
Pouco mais de 100 pessoas participaram nesta segunda-feira (1) de ato contra o golpe militar de 1964, que hoje completa 49 anos. A manifestação ocorreu na porta do Cinema Odeon, na Cinelândia, em frente ao Clube Militar, mesmo local onde há exatamente um ano houve confronto entre protestantes e militares da reserva, que comemoravam o início do golpe em um almoço. Neste ano, porém, o Clube Militar estava com as portas fechadas e com um tapume verde de isolamento.
Durante o ato desta segunda (01), banners com imagens de presos, torturados e mortos da ditadura militar, como Carlos Marighella, Stuart Angel, Luiz Carlos Prestes, Dinalva Conceição Oliveira, entre outros, foram expostos.
A jornalista Hilde Angel, irmã de Stuart Angel, esteve presente na manifestação e destacou que o momento é de construir uma nova geração de patriotas.
“Agora é um momento onde a verdade começa a ser lembrada. É hora de lembrar quem nós brasileiros somos, às vésperas dos 50 anos do início da ditadura militar. O comprometimento é com o patriotismo, de formar uma nova geração de patriotas que lutam pela verdade de seu país. Até hoje a família Angel não tem o corpo do Stuart para velar, chorar e enterrar. É por isso que hoje venho de luto, de preto, para fazer desse manifesto um velório, nesse espaço mais livre e democrático do Brasil, que é a Cinelândia”, afirmou emocionada Hilde. 


O mecânico Djalma Oliveira, irmão de Dinalva Oliveira Teixeira e cunhado de Antônio Carlos Monteiro Teixeira, integrantes da Guerrilha do Araguaia, mortos em 1979, seguia a mesma linha de Hilde e disse que a luta é por um “enterro digno” aos familiares de mortos durante a ditadura.
“Desde 1979 conhecemos os fatos do Araguaia e nós, da família de Dina (como a irmã era conhecida), em relação à morte, já estamos conformados. O que não nos conformamos é não termos os corpos para realizar um enterro digno, nossa luta há mais de 30 anos”, disse Djalma Oliveira, que ainda afirmou: “a Comissão da Verdade só será plena, com um relatório justo, se obrigarem os militares a abrirem os arquivos secretos, nos mínimos detalhes”.

Respondendo processo por constrangimento ilegal, por conta de uma foto publicada na imprensa em que aparecia cuspindo em um militar durante o protesto do ano passado, o estudante Felipe Garcês não se intimidou e voltou ao local nesta segunda. Segundo ele, que está sendo processado junto com o cineasta Sílvio Tendler, continuar na luta pela abertura dos arquivos é um “dever”.
“Não quero me comparar aos mortos da ditadura militar, mas depois da veiculação dessa imagem passei a sofrer ameaças por parte de alguns militares. Fotos da minha filha de três anos, da minha mulher e do meu prédio foram divulgadas. As ameaças eu entendo como natural da luta e é só metade do que ocorreu durante a ditadura. Estar aqui presente mais uma vez é o melhor que posso fazer para que a sociedade entenda o que aconteceu nesse período da história do Brasil”, afirmou o estudante.

 Apoio da sociedade civil

Um dos organizadores do ato contra a ditadura militar, Theófilo Rodrigues, sinalizou a necessidade de a Comissão da Verdade ganhar mais apoio da sociedade civil.
 “É necessário mais atividades públicas, nas ruas, que envolvam o sentimento da população em torno dos resultados dos relatórios. A criação de comissões estaduais é um passo para isso. Mas acredito que ganhar a sociedade seja o mais necessário no momento, assim os militares não conseguirão impedir que as verdades venham à tona. Além disso, temos que lutar para a comissão não ter um prazo para ser encerrada e pela criação do Museu Memória da Verdade, que seria no antigo prédio Dops”, afirmou Rodrigues.

Herança

Outro organizador do ato, Maurício Carneiro, o DJ Saddam, ressaltou a presença de hábitos dos antigos agentes da ditadura militar na atual polícia militar brasileira.
“Em todo o país a cultura repressora das polícias, de não conseguir ter capacidade de lidar com manifestações civis, está ainda presente. Existem torturas até hoje nas delegacias. Existem antigos torturadores da ditadura que hoje chefiam delegacias de polícia. A Comissão da Verdade precisa colocar em evidência todos eles e divulgar integralmente seus nomes”, destacou DJ Saddam.

Fora Marín!

Em determinado momento do ato, manifestantes pediram a demissão de José Maria Marín, atual presidente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF). De acordo com eles, Marín ajudou os militares na morte do jornalista Vladimir Herzog.

Aldeia Maracanã

Durante o ato, manifestantes apoiadores da antiga Aldeia Maracanã também estiveram presentes, protestando contra o que eles chamam de “Ditadura do (governador Sérgio) Cabral”. Por conta de bandeiras de partidos como PCdoB e PSTU houve um início de tumulto, mas nada além de discussão verbal.
“Não concordamos com a entrada de partidos políticos em atos como esse. Eles não levam à causa para as ruas, e sim o partido. A esquerda atual quer isso: se promover nessas manifestações”, afirmou um dos protestantes pró-Aldeia Maracanã, Fabrício Silva.
A manifestação foi organizada enquanto o deputado Jair Bolsonaro (PP), distribuiu faixas de apoio à ditadura.

31 de março é um dia para lamentar

O golpe de 1964 fez o Brasil dar um passo gigantesco para trás.

Geisel, de óculos escuros, foi um dos horrores nacionais
Geisel, de óculos escuros, foi um dos horrores nacionais
Num país, algumas datas são para celebrar. Outras, para lamentar.

O dia 31 de março é para lamentar.

Há 49 anos, uma conspiração destruiu uma democracia com o argumento cínico de que estava exatamente preservando a democracia.

O que havia de mais atrasado na sociedade da época se juntou na trama: militares, CIA, políticos conservadores e grandes empresários do jornalismo, como os Mesquitas, Roberto Marinho e Octavio Frias de Oliveira.

A administração que nasceu dessa aliança foi um colosso da inépcia. O Brasil piorou dramaticamente – excetuado o pequeno grupo que tomou conta do Estado.
A desigualdade floresceu.

O país se favelizou. Conquistas trabalhistas foram extirpadas, como a estabilidade. Greves – a única arma dos trabalhadores – foram proibidas. O ensino público que era excelente – e promovia a mobilidade social – foi devastado, com a perseguição a professores e o controle obsceno do que era ensinado nas salas de aula.

O Brasil deu um passo gigantesco para trás em 31 de março de 1964.
Os generais presidentes – Castelo Branco, Costa e Silva, Médici, Geisel e Figueiredo – merecem um esculacho eterno.

Falavam em combater a corrupção dos civis e não conseguiram criar em seu partido, a Arena, nada que fosse além de Paulo Maluf.

Foram mais de vinte anos de pesadelo.

Alguns cúmplices dos militares acabaram também se dando mal. Carlos Lacerda, o eterno conspirador, queria que eles derrubassem João Goulart e preparassem o terreno para que ele, Lacerda, ascendesse à presidência.

Os Mesquitas foram obrigados a publicar receitas para ocupar o espaço de textos censurados.
Frias foi submetido à humilhação de receber uma ordem telefônica para demitir o diretor de redação Claudio Abramo, e obedeceu.

Passou.

Mas é bom não esquecer que 31 de março é um dia para lamentar.

Documentos da ditadura estarão disponíveis na internet a partir de segunda

BRASÍLIA - Os arquivos e prontuários do extinto Departamento Estadual de Ordem Política e Social de São Paulo (DEOPS), um dos órgãos de repressão do país, estarão disponíveis para consulta na internet a partir de segunda-feira. A digitalização dos documentos foi realizada em parceria pela Associação dos Amigos do Arquivo Público de São Paulo e o projeto Marcas da Memória da Comissão de Anistia do Ministério da Justiça. Foram digitalizados cerca de um milhão de páginas de documentação, segundo o Ministério da Justiça.

A divulgação dos documentos também irá amparar o trabalho da Comissão de Anistia, além de servir para dar conhecimento ao público, para fins históricos e de pesquisa.

O trabalho de digitalização dos documentos levou dois anos para ser finalizado e segue até 2014. Para realização do projeto, a Comissão de Anistia transferiu mais de R$ 400 mil reais à Associação de Amigos do Arquivo. Em dezembro de 2012 o Ministério da Justiça autorizou novo repasse, de mais R$ 370 mil reais, para digitalização de outros acervos.

A digitalização dos arquivos foi fruto de um projeto patrocinado anualmente pela Comissão de Anistia, o Marcas da Memória, para selecionar projetos culturais, artísticos e científicos na temática “justiça de transição: reparação, memória e verdade”. O projeto da Associação de Amigos do Arquivo Público do Estado de São Paulo foi contemplado em 2011.

O lançamento do site que dará acesso ao conteúdo acontecerá na segunda-feira, no Arquivo Público de São Paulo,. Participarão do evento o presidente da Comissão de Anistia e Secretário Nacional de Justiça, Paulo Abrão, do governador do Estado de São Paulo, Geraldo Alckmin, e do atual coordenador da Comissão Nacional da Verdade, Paulo Sérgio Pinheiro.

SNI revela agente infiltrado no meio universitário

Os documentos já desclassificados da ditadura apresentam várias pistas sobre quem foram os agentes infiltrados nas universidades brasileiras, responsáveis por mortes, prisões e torturas de estudantes e professores. Esta foto produzida pelos agentes do SNI é uma delas: o homem em destaque foi identificado como “elemento de segurança”. Militantes da época o identificaram como “Oscar”, suposto estudante de Economia da PUC-RJ.



Brasília - A foto de um homem identificado apenas como “elemento de segurança” chama à atenção em meio aos documentos já desclassificados da ditadura militar, abertos à consulta pública no Arquivo Nacional. Pode ser uma das raras imagens identificadas pela própria ditadura sobre um tipo muito comum na época, que muitos prejuízos causaram à comunidade universitária do país: os agente infiltrados nas universidades, responsáveis por dedurar estudantes e professores que
militavam contra o regime.

A imagem foi produzida pelos próprios agentes do Serviço Nacional de Informação (SNI), o órgão de inteligência da ditadura, durante uma passeata pela anistia aos presos e perseguidos políticos, realizada no Rio de Janeiro, em 1979. Além de um círculo feito de caneta azul em torno do rosto do homem em destaque, apresenta a legenda curta, seca e manuscrita no verso: “elemento de segurança”.

As outras cerca de 90 fotos que os agentes produziram durante o evento atestam a minúcia com que o trabalho era conduzido: registraram os fotógrafos que cobriam a passeata para saber quais jornais poderiam vir a divulgar a pauta e congelaram os endereços exatos dos prédios em que seus moradores ou trabalhadores aderiram ao protesto, lançando papéis picados sobre a multidão.

Identificaram também todas as personalidades que participaram da manifestação, distribuindo panfletos e manifestando apoio à causa. Entre elas, o músico Milton Nascimento e os atores Osmar Prado, Lucélia Santos, Renata Sorrah, Roberto Faissal, Vanja Orico, Manfredo Colassanti, Sérgio Brito e Carlos Vereza. E também a militante Iramaya Benjamin, uma das fundadoras do Comitê pela Anistia.

Reconhecimento imediato
Professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), Luiz Mariano Carvalho, era ainda estudante à época e um dos dirigentes do MR-8, organização socialista clandestina que participou da luta armada contra a ditadura. Reconheceu de imediato o possível agente como um estudante do Departamento de Economia da PUC/Rio, que vivia tentando se aproximar das lideranças da Ação Popular (AP), um outro importante movimento de resistência ao regime. “Se não me falha a memória, ele se apresentava como Oscar”, recorda.

O professor conta que, como o pessoal do MR-8 e da AP era muito próximo, cruzou com ele em diversas atividades. “Naquela época, nós já suspeitávamos que fosse um policial infiltrado. Ele apareceu ninguém sabe de onde e, em curto espaço de tempo, se atirou com tudo na militância, o que era incomum. Nunca tivemos a confirmação, mas suspeitávamos que havia algo errado com ele. Me lembro do pessoal da AP falar sobre isso”, relatou à Carta Maior.

De acordo com Carvalho, naquele momento político, o movimento estudantil estava se reorganizando após tantas mortes e prisões, além de que a ditadura começava a ensaiar uma distensão maior. “Havia casos em que suspeitávamos de que nossos supostos companheiros fossem infiltrados, mas como não tínhamos muito com quem contar, permitíamos que eles nos acompanhassem. O que não deixávamos era que soubessem a localização dos altos dirigentes, ainda clandestinos no país, como era o caso, por exemplo, do jornalista Franklin Martins”, esclarece.

Fenômeno generalizado
A presença dos agentes infiltrados no dia a dia das universidades brasileiras foi um fenômeno generalizado em todo o país. Suas informações foram vitais para prisões, torturas, mortes e desaparecimentos de um número ainda desconhecido de estudantes e professores. A Comissão Nacional da Verdade (CNV) estima que cerca de 300 estudantes e professores foram mortos e desapareceram no período.

Até o momento, entretanto, somente a Universidade de Brasília (UnB) criou sua própria Comissão de Memória e Verdade e oficializou uma parceria com a CNV para pesquisar os prejuízos causados pela ditadura à universidade brasileira. Não existe uma linha de pesquisa definida sobre o tema específico dos agentes infiltrados, mas o coordenador de Relações Institucionais da Comissão, Cristiano Paixão, acredita que as investigações chegarão até a identidade dos que atuaram na instituição.

“São muitos os documentos disponíveis sobre o período, além de pesquisas acadêmicas e os relatos dos protagonistas. Acredito que a identidade dos agentes infiltrados deverá acabar aparecendo”, justificou.

Sobre a morte do comandante do DOI CODI!

Coronel teria dito a vizinhos que iria "mandar balas nos ladrões" se fosse assaltado

Julio Miguel Molinas Dias, 78 anos, foi morto na noite de quinta-feira quando chegava em casa

Coronel teria dito a vizinhos que iria "mandar balas nos ladrões" se fosse assaltado Jean Schwarz/Agencia RBS
Militar reformado teria reagido a ação dos bandidos e cerca de 15 tiros foram disparados Foto: Jean Schwarz / Agencia RBS
José Luís Costa
Em tempos de mobilização nacional em busca da verdade durante o longo período da ditadura no Brasil (1964-1985), a Polícia Civil gaúcha está diante de um crime que relembra um dos episódios mais sombrios do regime militar. O desafio dos investigadores é esclarecer a morte do coronel reformado do Exército Julio Miguel Molinas Dias, 78 anos, personagem que entrou para história dos anos de chumbo como chefe dos militares responsáveis pelo atentado ao Riocentro, três décadas atrás, no Rio de Janeiro.
O coronel foi assassinado quando chegava em casa às 21h de quinta-feira, na Rua Professor Ulisses Cabral, bairro Chácara das Pedras, em Porto Alegre, por razões ainda tão misteriosas como as atividades dele à frente do Destacamento de Operações de Informações — Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-Codi), na capital fluminense.
Viúvo, morando sozinho em um confortável sobrado na Rua Professor Ulisses Cabral, Molinas Dias foi alvejado a tiros ao retornar de uma visita a uma das filhas em um bairro vizinho. Investigações iniciais da Polícia Civil indicam que o militar, armado com uma pistola, reagiu à investida criminosa.
Mas os investigadores tentam descobrir por que um dos assassinos estava no banco do carona do C4 do militar e por qual razão foram disparados tantos tiros, cerca de 15 — três deles acertaram o coronel no tórax, no braço esquerdo e no rosto, o tiro fatal. Nada teria sido levado a não ser uma pistola que o militar portava. Uma bolsa de couro — com celular, óculos, relógios, carteira e R$ 231 — ficou dentro do veículo da vítima.
Teria sido o coronel vítima de:
1) Uma armadilha de quem desejava se vingar dele?
2) Um roubo de carro malsucedido?
3) Uma tentativa de assalto à residência do militar?
— Não se descarta nenhuma dessas hipóteses — afirma o delegado Luís Fernando Martins Oliveira, da 14ª Delegacia da Polícia Civil de Porto Alegre, responsável pelo caso.
Pelo menos em duas oportunidades, o coronel reformado do Exército comentou com a vizinhança que andava sempre armado para defesa pessoal — tinha pelos menos duas pistolas, um revólver e uma arma longa. Ao saber de uma tentativa de roubo de carro nas imediações, garantiu que, com ele, isso não aconteceria, pois iria "mandar balas nos ladrões".
Mas o cotidiano do militar indicava que ele não tinha inimigos. Vivendo as últimas duas décadas em Porto Alegre, o coronel fez apenas uma visita a uma delegacia da Polícia Civil, em junho, para o registro de uma ocorrência do recebimento de uma multa indevida — um carro com as mesmas placas do dele foi multado em Camaquã, cidade onde o militar nunca esteve.
Embora fosse homem de poucas palavras, Molinas Dias era querido pelos vizinhos com os quais conversava, quando caminhava até a praça em frente à casa dele ou ao se exercitar em uma academia.
— Ainda ontem (quinta-feira) pela manhã abanou para mim quando ia para a ginástica — lamentou, chorando, uma moradora do bairro Chácara das Pedras.
O coronel foi sepultado na tarde desta sexta-feira no Cemitério Jardim da Paz, em Porto Alegre. Na busca de pistas dos criminosos, a polícia conta com a ajuda da população. Informações podem ser repassadas pelo telefone de plantão da 14ª DP — (51) 3340.2299 — a qualquer hora do dia.
O Caso do Riocentro
- O atentado ao Riocentro ocorreu por volta das 21h de 30 de abril de 1981, durante show comemorativo ao Dia do Trabalhador. Um explosivo acabou detonando dentro de um Puma, onde estavam o sargento Guilherme do Rosário, que morreu, e o capitão Wilson Machado, que sobreviveu com graves ferimentos.
- Militares de extrema direita, descontentes com a abertura política iniciada pelo general João Figueiredo (1979-1985), cometeram o malogrado atentado no Riocentro. Queriam culpar grupos de esquerda, para causar um retrocesso no regime. No entanto, houve uma trapalhada, a bomba explodiu no colo do sargento Rosário.

- Ataques terroristas se multiplicavam pelo país, com bombas destruindo bancas de revistas e sedes de jornais de esquerda, os chamados "nanicos".
- Em agosto de 1980, uma carta bomba atingiu a secretária da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) no Rio, Lyda Monteiro da Silva, que teve o braço decepado e morreu no hospital. No mesmo dia, uma bomba foi detonada na Câmara de Vereadores do Rio, ferindo seis pessoas.