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Os quatro grupos em que se dividem os manifestantes

Diario do Centro do Mundo 

Dois deles, um de esquerda e outro de direita, disputam a hegemonia nas ruas.

No caminho da Ponte Estaiada
No caminho da Ponte Estaiada
O texto abaixo, de autoria do estudante de Filosofia Amaro Fleck, foi publicado no site Vaidapé.
Nos últimos dias, diversas interpretações sobre o significado e as demandas dos protestos, as mais distintas entre si, têm aparecido.

Ora se argumenta que as manifestações têm um caráter progressista, ora conservador.
Há quem veja uma sublevação popular, há quem veja apenas abastados clamando pela manutenção de seus privilégios.

Uns vêem avanços democráticos, outros tentativa golpista.

Nesta revolta tão ampla, com demandas aparentemente tão vagas, há fortes indícios que justificam todas elas.

Mesmo assim, é possível vislumbrar um pouco melhor o que se passa.

A primeira coisa que se deve questionar é quem está nas ruas. Engana-se quem pensa que é o “povo brasileiro”, isto é, que nele estão inclusos segmentos de todos os grupos sociais. Mas é, sim, parte significante dele.

Os protestos se iniciaram puxados por jovens de classe média, na maioria estudantes, que de alguma forma se identificam ou simpatizam com o Movimento Passe Livre (MPL).

São politizados, de esquerda, e sua pauta é por um melhor transporte público, mais barato (de preferência gratuito).

Não só, eles querem isto com mais justiça. Veem a desigualdade social com um problema de primeira grandeza e almejam diminuí-la (o passe livre seria, justamente, um meio para tal fim).
Não são poucos.

Quando a Folha, o Estadão e a Globo pediam à tropa de choque mais rigor para acabar com o que consideravam baderna eles já eram mais de vinte mil pessoas nas ruas paulistanas.
Quando o governador Geraldo Alckmin ouviu o clamor da imprensa, a tropa de choque agiu, nas palavras da Folha, sem discernimento.

O uso excessivo da força policial atingiu não só os manifestantes, como a grande imprensa pedia, mas também diretamente alguns de seus jornalistas.

Duzentas e poucas pessoas, incluídos jornalistas, foram presas para averiguação (um procedimento arbitrário e injustificado que lembra o pior de outrora).

Foi o estopim para os protestos se massificarem, trazendo dois novos grupos à cena.
O primeiro grupo era de jovens, na maioria estudantes, politizados, de esquerda, com uma pauta clara já presente nos protestos.

O segundo foi, ao menos no começo, mobilizado pelo primeiro. São também jovens de classe média, na maioria estudantes, mas até então sem maiores experiências políticas, excetuada a participação nas eleições.

O que os motiva é também uma insatisfação com o transporte. Para este grupo, que recém conquistou a autonomia de ir e vir sem depender de permissões paternas (ou mesmo que ainda depende disto), o custo com o transporte é uma séria restrição as suas liberdades.

Embora não sejam, em sua grande maioria, pobres, eles lidam com um orçamento limitado obtido com os pais ou com eventuais bicos, estágios, bolsas de estudo, e perdem grande parte dele para se locomover.

No entanto, este grupo, até então aviltado pelo rótulo de alienados e recém descobrindo sua dimensão social, acredita ser pouco justificável demandar a redução de meros vinte centavos no preço das passagens.

Com a aprovação midiática, tal grupo pluraliza as demandas, mas sempre pagando o preço de esvaziá-las.

Clamam por uma nova política, sem corrupção. Anseiam pelo novo e evitam, a todo custo, qualquer identificação.

Por isso hostilizam os partidos, sindicatos e movimentos sociais que participam do primeiro grupo (excetuado, neste caso, o MPL).

Seus símbolos apenas servem como contrassímbolos, capazes de identificá-los sem determiná-los: a bandeira e o hino nacional; a máscara do Anonymous.

São os patrioteens e ainda não aprenderam que a rua e os protestos são suficientemente grandes para nele coexistirem bandeiras distintas.

O terceiro grupo, que se soma aos protestos concomitantemente ao segundo (mas menor, nos protestos, que este), é formado sobretudo por marginalizados.
São moradores da periferia, desempregados ou subempregados. Participam mais ativamente nas cidades que são palco de eventos esportivos.

Foram, muitas vezes, prejudicados por eles, seja diretamente pelas remoções, seja pela política de pacificação das favelas que fez os aluguéis triplicarem, expulsando-os de bairros não tão distantes da cidade.

Têm uma demanda muito legítima de inclusão social, mas desconhecem a forma de reivindicá-la e não conseguem traduzi-la em demandas específicas.

Parte dele é mais violenta e promove saques. O Estado que pede que se manifestem de forma pacífica e ordeira nunca foi, ele mesmo, pacífico e ordeiro ao lidar com eles.

Por fim, um último grupo, pequeno, mas barulhento (em especial: capaz de se fazer ouvir) surge nas manifestações.

É a classe média alta ou o segmento que se reconhece nos valores dela. Odeia o PT e pensa que os dez anos de lulismo foram os piores da história do país.

Sonha em derrubar a presidenta e dar fim ao partido dela.

Sobretudo, temem a perda de seus privilégios (muito embora o lulismo tenha atacado, infelizmente, muito poucos deles).

Suas bandeiras são o fim da corrupção, a moralização da política, a diminuição dos impostos e do Estado, o arquivamento da PEC 37, além do fora Dilma/fora PT.

Quase não é preciso dizer que a grande imprensa foca em suas demandas e se reconhece nelas.
Os protestos em sua forma atual são a conjunção destes diferentes grupos.

O primeiro e o quarto se antagonizam entre si, pois são mutuamente excludentes.

Disputam os patrioteens, que são mais mobilizados pelo primeiro, mas ecoam mais a pauta do quarto.
Todos tentam, sem sucesso, excluir o terceiro, por causa de sua índole arruaceira.

O futuro desta convulsão social depende do arranjamento destas distintas forças.

Quem está ausente nos protestos?

Em especial dois grupos: a classe trabalhadora tradicional, quer operária quer camponesa (mesmo sendo às vezes representada vagamente por um ou outro sindicato) e o imenso subproletariado, tanto o ascendente – também chamado de nova classe média ou nova classe trabalhadora – quanto o estagnado, a maior parte dos pobres.

Isto é, a base social do lulismo, que faz com que, apesar de toda insatisfação reinante, a presidenta siga bem-avaliada e com sua reeleição, por ora, assegurada.

Se o protesto é progressista ou conservador? Difícil chegar a uma conclusão agora.
O certo é que traz boas novas por enquanto: uma guinada do atual governo para a esquerda, para uma preocupação maior com a inclusão social.

O discurso presidencial pareceu auspicioso. Reinaldo Azevedo, arguto arauto do atraso brasileiro, observou: “O movimento que está nas ruas provocará uma reciclagem do PT pela esquerda, poderá tornar o resultado das urnas ainda mais inóspito” para aquilo que ele defende (o atraso e a injustiça que confunde com a democracia e a racionalidade).

Oxalá que seu temor se concretize.

O Day After: Implicações de uma vitória


A vitória superlativa das ruas com a reversão do reajuste tarifário em SP foi saboreada pelos dirigentes do MPL com um misto de euforia e alívio. 

A continuidade dos protestos evidenciava uma crescente diluição do movimento nas tinturas  de uma desqualificação do governo federal e das  conquistas econômicas e sociais dos últimos dez anos. 

A jovem liderança do MPL, que se declara de esquerda, admite que já não sabia como reverter a usurpação martelada pela emissão conservadora. 

Há atitudes óbvias. Incompreensivelmente ainda não adotadas por quem dispõe de todos os holofotes da boa vontade nesse momento. 

Uma sugestão prosaica: convocar uma entrevista coletiva e desautorizar  o dispositivo midiático conservador, que surfa na onda dos novos cara-pintadas para rejuvenescer a narrativa de um antipetismo histórico. 

A abusada antecipação da campanha de 2014 inclui cenas -e ameaças--  de invasão de palácios, mesmo quando ocupados por governantes já comprometidos com a redução tarifária. 

Essa era a agenda da 'comemoração' no RS, nesta 5ª feira. 

Qual o propósito dessa sessão de fotos com data e hora marcada? A

os integrantes do MPL  não cabe o bônus da ingenuidade. Embora jovens, souberam fixar um alvo de notável pertinência histórica. 

A  mobilização de massa em defesa da tarifa zero e por uma cidade dos cidadãos carrega a promessa de um chão firme do qual se ressente  o planejamento democrático no país. Só um movimento urbano forte, capaz de disputar a construção da cidade com a lógica do lucro imobiliário poderá reverter o caos das grandes metrópoles. 

Se for a semente disso, o batismo de fogo do MPL, com todas as suas lacunas, já terá valido a pena. Antes, porém, precisa se desvencilhar da carona oportunista que hoje embaralha a sua extração histórica e pode ferir de morte a credibilidade conquistada nas ruas.

“Transporte coletivo gratuito é tão viável quanto o SUS”

Lucio Gregori - Tarifa zero é possível

O engenheiro Lúcio Gregori, secretário de Transportes na cidade de São Paulo no governo Luíza Erundina (1989 a 1992 - eleita pelo PT), argumenta que a política tributária no Brasil impede a aplicação da gratuidade no transporte coletivo, tão viável quanto o SUS (Sistema Único de Saúde), escolas públicas e coleta de lixo.

Gregori avalia que uma das formas de pressionar por um transporte mais barato é fazer justamente o que os jovens paulistanos estão fazendo: ocupar as ruas e cobrar a redução da tarifa.
Em sua opinião, transporte não é uma questão técnica, mas um debate em que está colocada a disputa pelos recursos públicos.

Gregori diz que no Brasil a tradição é “transformar o transporte coletivo numa atividade econômica atraente para o setor privado e que acaba sendo prejudicial para as pessoas que usam o transporte e para a cidade como um todo”.

Três fatores contribuem para isso, segundo ele.
“O primeiro é o sistema de concessão de serviço público por tempo muito prolongado, podendo chegar a 25 anos, o que vai contra a dinâmica das cidades e causa contradições de interesses futuramente. 

O segundo é o modelo de vincular o transporte coletivo ao pagamento da tarifa e tratá-lo como um negócio qualquer, sendo que é um serviço de utilidade pública. 

O terceiro ponto é a priorização do transporte individual motorizado.”

“O resultado é um transporte coletivo ruim e caro, e o grande sonho de todos é ter um carro para se libertar, levando a congestionamentos, estresse, poluição e mau funcionamento das cidades como um todo. 

O cidadão tem o direito de ir e vir, mas não tem como exercê-lo, sendo sonegado o acesso da população a vários serviços básicos, culturais etc.”

São Paulo e Rio cedem à pressão e revogam aumento do transporte

Por Eduardo Simões e Silvio Cascione
SÃO PAULO, 19 Jun (Reuters) - Os governos de São Paulo e Rio de Janeiro cederam às pressões populares e revogaram nesta quarta-feira o aumento das tarifas dos transportes públicos, após uma onda de manifestações que tomou nos últimos dias as ruas de diversas cidades do país.

A decisão de voltar atrás no aumento-- que deu início às maiores manifestações populares no país em duas décadas-- foi anunciada simultaneamente pelos prefeitos das duas maiores cidades do país e pelo governador de São Paulo. Mas mesmo com a revogação do aumento, ainda não está claro se os protestos irão continuar no país.

Na capital paulista, o preço do bilhete de ônibus voltará a ser de 3,00 reais. O valor da tarifa do metrô e do trem metropolitano, sob alçada do governo do Estado, também será reduzido para o mesmo preço, frente aos atuais 3,20 reais.

"Vamos ter que cortar investimentos, porque as empresas (de transportes) não têm como arcar com essa diferença", afirmou o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB).
Alckmin fez o anúncio de redução da tarifa ao lado do prefeito da cidade de São Paulo, Fernando Haddad (PT), pouco após o governo federal afirmar que não tem condições de reduzir mais tributos do setor de transportes.

Na cidade do Rio, o prefeito Eduardo Paes (PMDB) disse que a passagem de ônibus voltará a 2,75 reais, depois de ter subido para 2,95 reais no início do mês, e enfatizou que isso terá um impacto anual no orçamento do município de cerca de 200 milhões de reais.

"Decidimos, em conjunto com a Prefeitura de São Paulo, suspender o aumento dos 20 centavos concedidos no início de junho" disse Eduardo Paes, acrescentando que as duas maiores cidades do país precisavam mostrar "nosso respeito e atenção a essa absoluta maioria de pessoas que foi às ruas manifestar sua insatisfação".

"Ainda vamos estudar como isso vai ser feito. Vamos ter que pressionar o Congresso para que medidas sejam tomadas e os custos sejam repartidos", acrescentou o prefeito carioca.
O governo do Estado do Rio de Janeiro também anulou os reajustes das tarifas dos trens, barcas e metrô a partir de sexta-feira.
São Paulo e Rio vêm sendo os principais palcos das manifestações que começaram há cerca de duas semanas e passaram a incluir, além de redução da tarifa, reivindicações por melhores serviços públicos, combate à corrupção e contra os gastos com a Copa do Mundo de 2014.

O ápice das manifestações até agora ocorreu na segunda-feira, quando mais de 200 mil pessoas foram às ruas de várias capitais. Em sua maioria, os protestos foram pacíficos, mas houve atos de violência empreendidos por pequenos grupos.

Após os protestos de segunda, prefeitos de outras capitais anunciaram queda no preço da passagem de transporte.

Em São Paulo, Haddad e Alckmin relutavam em reduzir a tarifa do transporte público, argumentando que isso implicaria redução dos recursos destinados a áreas como educação e saúde.

De acordo com uma fonte do governo federal, a presidente Dilma Rousseff avaliou que seria necessário dar uma resposta concreta e clara aos manifestantes, e o assunto foi discutido na terça-feira com o prefeito paulista.

No início das manifestações, os dois governantes chegaram a descartar uma revogação do aumento, alegando que o reajuste deveria ter acontecido no início do ano e que foi postergado para junho a pedido do governo federal.

MANIFESTAÇÕES DEVEM CONTINUAR

 Segundo o cientista político Carlos Melo, do Instituto de Ensino e Pesquisa (Insper), o recuo representa uma derrota para as autoridades.
"Isso, ao meu ver, denota uma vitória do movimento e uma derrota das autoridades, que levaram a negociação ao limite e não conseguiram depois bancar a sua posição inicial", disse à Reuters.
Segundo o especialista, ainda não está claro se a revogação da alta das tarifas será suficiente para acabar com a mobilização popular. Para Melo, existe a chance de que outras insatisfações manifestadas durante os protestos tornarem-se bandeiras daqui para frente.

"Eles têm o gosto da vitória, de que é possível, então agora podem partir para um outro rol de exigências", avaliou.

Lideranças do Movimento Passo Livre (MPL), que iniciou o movimento pela redução das tarifas, disseram que a manifestação marcada para quinta-feira, em São Paulo, está mantida, mas deve ter um caráter "mais festivo", para comemorar a derrubada do reajuste. O movimento pretende continuar lutando pela gratuidade do transporte público.

Além de São Paulo, estão marcadas para quinta-feira manifestações em mais de 70 cidades do país.
Um levantamento feito pelo Ibope, via Internet, junto a 1.775 internautas apontou que 33 por cento deles acreditam que as manifestações vão continuar, mesmo com a revogação da alta das tarifas.
"Então, não há segurança de que as manifestações vão parar, mesmo reduzindo o preço da passagem", disse à Reuters a diretora do Ibope Inteligência, Laure Castelnau.

Após o anúncio da revogação do reajuste, centenas de pessoas ocuparam parte da Avenida Paulista para comemorar.

Nesta quarta, as manifestações na capital paulista atingiram áreas mais periféricas e vias de acesso à cidade. Manifestantes chegaram a interromper o fluxo da rodovia Anchieta, queimando pneus no sentido São Paulo. A estrada foi desbloqueada, e os manifestantes seguiram em passeata pelas ruas da cidade de São Bernardo do Campo. Interdições também foram registradas na rodovia Régis Bittencourt, avenida Guarapiranga e Estrada do M'Boi Mirim.

Também ocorreram manifestações em outras cidades, como Niterói(RJ) e Fortaleza, onde foi realizado o jogo do Brasil e México pela Copa das Confederações.

(Reportagem adicional de Rodrigo Viga Gaier, no Rio de Janeiro; e de Alonso Soto, em Brasília)

Haddad sinaliza redução da tarifa em SP; secretário propõe imposto sobre a gasolina da bomba


UOL
O prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, se comprometeu nesta terça-feira (18) a examinar a planilha de custos de transporte do município para "refletir no que eu poderia cortar de serviços para viabilizar a redução da tarifa". Ele, no entanto, não revogou o aumento durante a reunião do Conselho da Cidade, que foi praticamente unânime ao pedir a suspensão do novo valor de R$ 3,20.
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Manifestantes vão às ruas em protesto contra o aumento da tarifa do transporte público e por outras reivindicações nesta segunda-feira (17), em Salvador Lúcio Távora/A Tarde

Protestos contra o aumento da tarifa do transporte coletivo200 fotos

"Temos caminho [para a redução], mas isso passa pela desoneração dos tributos federais e estaduais que incidem sobre o transporte público, como por exemplo o ICMS [Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços] sobre o diesel, que já seria responsável por R$ 0,07 dos R$ 0,20 do aumento", disse.

Haddad também se mostrou favorável a examinar os lucros dos empresários das concessionárias de ônibus para "cortar gordura" e ressaltou que o imposto sobre a gasolina direto da bomba seria uma solução. "Se as prefeituras absorverem todo o impactos dos subsídios [tarifa], vão quebrar", destacou.

Durante a reunião, o secretário municipal de Transportes, Jilmar Tatto, afirmou que a redução da tarifa custaria R$ 300 milhões para os cofres da cidade e propôs que o "usuário de transporte individual também arque com os custos do transporte coletivo, assim como a Prefeitura e os empresários."

Para compensar a perda, ele defendeu a cobrança de um imposto sobre a gasolina direto da bomba, uma municipalização do Cide (Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico), imposto federal já em vigor.

De acordo com Tatto, "não é possível espremer tanto assim os empresários das concessionárias de transporte para viabilizar a revogação do aumento", afirmou, referindo-se a afirmações feitas pelos conselheiros de que o lucro das empresas de transporte poderia financiar uma tarifa menor.

"Como cidadão, acho que quem deveria financiar o transporte público é o transporte individual. Além de melhorar a mobilidade, incentivando quem tem carro a usar o transporte público, já que a gasolina seria mais cara e as tarifas mais baratas, ainda existem os benefícios ecológicos do processo", disse Haddad sobre a proposta.

O prefeito disse que vai se reunir ainda nesta semana com representantes do Movimento Passe Livre. "Eu quis apresentar os dados para que todos saibam o que vai acontecer caso a cidade de São Paulo opte por revogar o aumento", afirmou.

Segundo Haddad, o valor que a Prefeitura perderia com a redução do valor da tarifa ou com o congelamento até 2016 seria suficiente para contratar 20 mil médicos ou dobrar a rede de hospitais. "A decisão precisa ser tomada com base em informações, e eu sinto que ainda há muito desinformação sobre o assunto. É preciso que a sociedade saiba quais as consequências de cada decisão."

Ele ressaltou também que não quer a desmobilização dos protestos contra o aumento. "Está lindo vocês nas ruas. É vibrante um país que vai para as ruas."

Conselho pede redução da tarifa

A maioria dos integrantes do Conselho da Cidade, criado por Haddad no início do mandato dele, pediu a redução da tarifa do transporte público na capital paulista durante reunião extraordinária realizada hoje.


 Manifestante durante concentração para o 5º protesto contra o aumento da tarifa do transporte coletivo no largo da Batata, em Pinheiros (zona oeste de São Paulo) Léo Pinheiro/Futura Press

Manifestantes contam em cartazes quais são suas reivindicações 54 fotos

 O conselho tem caráter apenas consultivo, mas entre os membros do grupo há um sentimento de que se o prefeito for contra um decisão unânime é o caso de repensar a função do comitê. Em resposta, Haddad disse que vai ouvir "todo mundo para não fazer nada precipitado" e ressaltou que não  criou o conselho para "inglês ver".
A arquiteta e urbanista Raquel Rolnik criticou o poder que as concessionárias de transporte têm nas decisões. "É preciso suspender o aumento [das tarifas do transporte em São Paulo] imediatamente e rediscutir o modelo da concessão de transportes. O que os protestos nas ruas estão dizendo é 'queremos participar ativamente do processo decisório.'"

Outro integrante do conselho, o jornalista e blogueiro do UOL Leonardo Sakamoto, também defendeu a suspensão do aumento das tarifas, que elevaram o preço do transporte coletivo em São Paulo de R$ 3,00 para R$ 3,20. "O primeiro passo é a revogação do aumento e, depois, a discussão e os debates sobre o modelo", afirmou. "Existem várias fontes de onde a prefeitura pode tirar recursos, como, por exemplo, aumentar o IPTU de estacionamentos", disse.

De acordo com o conselheiro Luís Carlos Bresser, a prefeitura precisa aproveitar o momento de licitação das empresas de transporte para limitar a taxa de lucro das companhias. Sônia Coelho, também conselheira, questionou se o valor gasto pelo governo com gás lacrimogêneo e balas de borracha não poderia suprir os custos da prefeitura com a redução da tarifa.

O Conselho, que é formado por representantes de movimentos sociais, sindicatos e associações empresários, além de intelectuais, artistas, políticos, lideranças religiosas e jornalistas, tem o objetivo de acompanhar o plano de metas da atual gestão, analisar a revisão do plano diretor, entre outros temas.
Entre os conselheiros estão Odilo Scherer, cardeal arcebispo de São Paulo, Juvandia Moreira Leite, predidente do Sindicato dos Bancários, Fernando Quaresma, presidente da Associação da Parada com Orgulho LGBT, Murilo Portugal, presidente da Febraban, Oded Grajew, fundador do Instituto Ethos e coordenador geral da Rede Nossa São Paulo, Viviane Senna, presidente do Instituto Ayton Senna, Eugênio Bucci, jornalista e professor da USP, entre outras cerca de 150 pessoas.

IPTU

Mais cedo, Haddad afirmou que dobrar o valor do IPTU não seria suficiente para zerar a tarifa do transporte público da capital paulista, como quer o Movimento Passe Livre (MPL), que também participa do encontro.

De acordo com ele, a medida cobriria apenas 50% do valor. "Isso porque 60% dos impostos estão vinculados a saúde e educação, de acordo com a Constituição Brasileira", disse.
Para Mayara Vivian, uma das líderes do MPL, "se há dinheiro para estádios, há dinheiro para o transporte". Segundo ela, a decisão do aumento da tarifa é política. "Não acreditamos que seja uma questão só de remanejar impostos. O modelo de transporte e o papel dos empresários precisa ser revisto".

Haddad havia afirmado antes da fala do MPL que nos países desenvolvidos os empresários são responsáveis por subsidiar um terço do valor da passagem. De acordo com o prefeito, em São Paulo, esse valor é de apenas 10%.

Referendo

Durante a reunião, a Rede Nossa São Paulo apresentou um documento sugerindo que o valor da tarifa e o modelo do transporte público seja definido em um referendo.

A rede também quer que seja criado um conselho municipal de transporte junto à Secretaria Municipal de Transporte para apresentar em 60 dias um estudo com as principais propostas para um Plano de Mobilidade e Transportes Sustentáveis. Posteriormente, o plano deverá ser apresentado e discutido com a população.

O documento da rede também cobra que o Governo Federal entre no rateio dos custos para priorizar o transporte público, "posto que já contribuiu bastante para financiar e subsidiar o transporte individual".

Saturação e projeto

A rapidez e a abrangência dos acontecimentos em marcha turvam  a compreensão mais geral do que se passa no país. 

O que se viu nas últimas horas espraiou estupefação e perplexidade nas diferentes dimensões da vida política e partidária. Em 11 capitais, dezenas de milhares aderiram aos protestos. 

Os 20 centavos que motivaram a mobilização inicial em São Paulo, no dia 6 de junho, tornaram-se ainda mais irrisórios diante da abrangência e da intensidade do que se vê 12 dias depois. 

O que está em jogo é muito mais do que caraminguás. As ruas requisitam uma nova agenda política para o Brasil. 

Não significa desqualificar conquistas e avanços preciosos dos últimos anos. 

Mas a história apertou o passo. 

Talvez até porque a musculatura do percurso agora o permite. 

As instituições e canais de escuta não souberam  interpretar o vapor acumulado nessa marcha batida. 

Um viés economicista pretendeu resolver na base da macroeconomia  -à frio--  aquilo que pertence ao apanágio da democracia: as escolhas do futuro e o sacrifício do presente. 

 A liderança do processo brasileiro está em aberto. Hoje, ninguém é de ninguém. 
 Leia aqui o que eu, Paulo Morani, escrevi a dois dias

A ausência de uma plataforma capaz de dar unidade e coerência a aspirações fragmentadas e avulsas pode asfixiar o que as ruas tentam dizer. 

Na Espanha, a vitória eleitoral do ultra-conservadorismo, em 2011, só foi possível porque a abstenção, sobretudo jovem,  atingiu proporções epidêmicas no berço mundial dos indignados. 

A exemplo do que ocorreu na Espanha, nos EUA e, mais recentemente, na Itália , em algum momento os indignados brasileiros serão chamados a refletir - talvez precocemente - sobre as escolhas do poder. 

O poder de Estado. 

Os compromissos que a luta pelo poder impõe. 

A impossibilidade de ignorá-la; e, sobretudo, a escolha da melhor estratégia para pautar o seu exercício,  a cada movimento da história.
Do Carta Maior

Como não tem liderança?

Mayara Vivian, uma dos representantes do MPL, deixa prédio da Secretaria de Segurança nesta segunda-feira
Quem é essa que se "reuniu com as autoridades".
Como não tem liderança?

Claro que tem.

Não existe nada que apareça por acaso.

A PM começou a batalha na Maria Antônia

Elio Gaspari

Quem acompanhou a manifestação contra o aumento das tarifas de ônibus ao longo dos dois quilômetros que vão do Teatro Municipal à esquina da Consolação com a rua Maria Antônia pode assegurar: os distúrbios desta quinta-feira começaram às 19h10m, pela ação da polícia, mais precisamente por um grupo de uns vinte homens da tropa de choque, com suas fardas cinzentas, que, a olho nu, chegaram com esse propósito.

Pelo seguinte: às 17h, quando começou a manifestação, na escadaria do teatro, podia-se pensar que a cena ocorria em Londres. Só uma hora depois, quando a multidão engordou, os manifestantes fecharam o cruzamento da rua Xavier de Toledo. Nesse cenário, havia uns dez policiais. Nem eles hostilizaram a manifestação, nem foram por ela hostilizados.

Por volta de 18h30m, a passeata foi em direção à Praça da República. Havia uns poucos grupos de PMs guarnecendo agências bancárias, mais nada. Em nenhum momento foram bloqueados. Numa das transversais, uns vinte PMs postaram-se na Consolação, tentando fechá-la, mas deixando uma passagem lateral. Ficaram ali menos de dois minutos e retiraram-se. 

Esse grupo de policiais subiu a avenida até a Maria Antonia, caminhando no mesmo sentido da passeata. Parecia Londres. Voltaram a fechá-la e, de novo, deixaram uma passagem. Tudo o que alguns manifestantes faziam era gritar: “Você é soldado, você também é explorado” ou “Sem violência”. Alguns deles colavam cartazes brancos com o rosto do prefeito de São Paulo, “Fernando Maldad“.

Num átimo, às 19h10m, surgiu do nada um grupo de uns vinte PMs cinzentos, com viseiras e escudos. Formaram um bloco no meio da pista. Ninguém parlamentou. Nenhum megafone mandando a passeata parar. Nenhuma advertência. Nenhum bloqueio sem disparos, coisa possível em diversos trechos do percurso. Em menos de um minuto esse núcleo começou a atirar rojões e bombas de gás lacrimogênio. 
Chegara-se a Istambul.

Atiravam não só na direção da avenida, como também na transversal. Eram granadas Condor. Uma delas ficou na rua que em 1968 presenciou a pancadaria conhecida como “Batalha da Maria Antônia”. Alguns deles, sexagenários, não cheiram mais gás (suave em relação ao da época), mas o bouquet de vinhos.

Seguramente a PM queria impedir que a passeata chegasse à avenida Paulista. Conseguiu, mas conseguiu que a manifestação se dividisse em duas. Uma, grande, recuou. Outra, menor, conseguiu subir a Consolação. Eram pessoas perfeitamente identificáveis. A maioria mascarada. Buscaram pedras e também conseguiram o que queriam: uma batalha campal.
Foi um cena típica de um conflito de canibais com os antropófagos.