Mair Pena Neto
No momento em que o Fluminense vive uma fase boa nos campos – disputa
as primeiras posições do Campeonato Brasileiro e parece rumar para mais
uma participação na Taça Libertadores da América (que seria a quarta em
seis anos) – o clube tem frequentado o noticiário por razões que não
condizem com suas tradições.
Primeiro pela atitude delinquente de uma torcida organizada, que
agrediu covardemente torcedores vascaínos, e, em seguida, pela ausência
injustificada do presidente do clube numa reunião no Tribunal de Justiça
do Rio exatamente para tratar da violência das torcidas que, diga-se de
passagem, não é privilégio do Fluminense.
A agressão e até o roubo praticado pela torcida Young Flu é um desvio
de função do que seria uma torcida organizada, que encontra muitas
explicações, mas não se justifica. A disputa saudável entre times rivais
torna-se doentia e os adversários viram inimigos, a ponto de se
matarem. Como disse a mãe de um dos integrantes da Young Flu, que foi
preso e teve seu rosto estampado nos jornais como criminoso, “eles saem
de casa para matar” e seu filho mudou de comportamento desde que entrou
para o grupo.
O episódio recente não traz nenhuma novidade para quem frequenta
estádios de futebol. Estes grupos organizados não respeitam nem os
demais torcedores dos próprios times, e passam em bando e agressivamente
em meio a eles na chegada e saída dos jogos, invariavelmente com o
propósito de arrumar confusão. A Young Flu em sua música – melhor seria
dizer canto de guerra – exalta os confrontos com as torcidas rivais dos
outros times, como se a glória fosse a vitória na pancadaria e não em
campo.
Nos últimos anos, no Fluminense e também em outros times do Rio
surgiram novas torcidas organizadas que, por meio de convocações nas
redes sociais, criaram uma nova forma de torcer, que alegrou os
estádios. No caso do Fluminense, organizaram mosaicos que coloriram as
arquibancadas e atraíram de volta aos jogos famílias que tinham deixado
de comparecer justamente pela violência. O sucesso destas novas torcidas
tirou o protagonismo das facções organizadas, que chegaram a
ameaçá-las, o que revelou, uma vez mais, seu caráter criminoso.
A violência dessas torcidas é conhecida do Estado e da polícia. Todas
elas já são atualmente escoltadas por policiais na chegada aos
estádios. A escolta é o reconhecimento pelas autoridades do potencial
criminoso dessas organizações. Ou seja, tudo isso é sabido. A novidade
foi a chance que o episódio da prisão dos torcedores da Young Flu
proporcionou. A polícia decidiu agir com mais rigor, autuando o grupo
por lesão corporal, formação de quadrilha e corrupção de menores, e
anunciou um combate sistemático a esses grupos para tentar erradicar de
vez o problema.
Foi assim na Inglaterra, onde o comportamento dos hooligans era
conhecido e foi tratado de forma amena até que uma grande tragédia, a do
estádio de Heysel, levou as autoridades a endurecer as leis, reforçar a
vigilância nos estádios e adotar uma série de outras medidas que
reduziram significativamente a violência. Aqui, a oportunidade está
apresentada, principalmente pela proximidade da Copa do Mundo de 2014.
Mas logo na primeira reunião para tratar de ampliar a competência dos
juizados especiais criminais nos estádios, uma forma de agilizar o
combate à violência, o presidente do Fluminense não comparece, atitude
lamentada pelo presidente do Tribunal de Justiça, que comandou o
encontro.
Será que havia algo mais relevante para o presidente do Fluminense
fazer no dia que justificasse a sua ausência? Será que ele não poderia
sequer enviar um vice-presidente ou diretor no caso de real
impossibilidade? A ausência de Peter Siemsen, além da deselegância que
não corresponde à fidalguia tricolor, revela o desinteresse em atacar um
dos mais graves problemas do futebol brasileiro, e, pior, levanta a
suspeita de que tenha evitado explicar como ingressos de cortesia
destinados exclusivamente à diretoria do clube foram parar nas mãos de
cambistas presos nos arredores do Engenhão quando tentavam vendê-los.