O ex-governador do DF José Roberto Arruda deu seu depoimento sobre o mensalão do DEM |
Dois anos e meio após ser preso e ter o mandato cassado acusado de
ser chefe do esquema criminoso batizado de mensalão do DEM, o
ex-governador do Distrito Federal José Roberto Arruda deu o primeiro depoimento na terça-feira à Justiça.
Ele negou as acusações, disse que foi vítima de vingança de inimigos
e, dando socos na mesa, ameaçou ir à forra: “Já que destruíram minha
vida mesmo, não tenho pressa. Só digo uma coisa: ainda não apareceu nem
metade da missa.”
Arruda está indiciado na ação penal 707, que corre no Superior
Tribunal de Justiça (STJ), pelos crimes de corrupção, lavagem de
dinheiro e formação de quadrilha, podendo pegar mais de 20 anos de
prisão caso seja condenado. Ele foi ouvido no Tribunal de Justiça do
Distrito Federal, por delegação do ministro Arnaldo Esteves Lima,
relator da ação. A quadrilha, segundo as investigações da Polícia
Federal, teria desviado mais de R$ 1 bilhão dos cofres públicos em seis
anos.
O delator do esquema, o ex-secretário de Relações Institucionais
Durval Barbosa, que também depôs na terça-feira, reafirmou a denúncia de
que Arruda comandava a organização criminosa. Ele disse que pagava as
contas do ex-governador com “dinheiro sujo”, inclusive viagens
internacionais. “Deixava dinheiro escondido, dólares, em um banheiro
para ele”, afirmou. Explicou que Arruda frequentava a casa dele e que
teria deixado dinheiro de contratos de informática até com a sogra dele.
Exaltado, Arruda negou as acusações e disse que todos os diálogos
apresentados por Durval e periciados pela PF foram editados e
manipulados. “Acabaram com a minha vida pública porque eu não cedi às
chantagens desses bandidos”, garantiu. Mas entrou em contradição e
admitiu que, após eleito, recebeu os empresários financiadores de sua
campanha, que teriam lhe cobrado a fatura. “Financiamento privado de
campanha é fonte de crise permanente”, observou ele, citando como
exemplo o mensalão petista do governo Luiz Inácio Lula da Silva.
Um dos maiores esquemas de corrupção da política brasileira, o
mensalão do DEM foi desmantelado em novembro de 2009 pela Operação Caixa
de Pandora, da Polícia Federal. O esquema consistia no desvio de
recursos públicos em contratos “viciados”, cobrança de propina de
empresários que tinham negócios com o governo e rateio de caixa dois
entre autoridades e políticos da base aliada. Entre 2000 e 2009, teriam
sido desviados mais de R$ 1 bilhão dos cofres públicos.
Além de Arruda, figuram na lista de 37 denunciados pelo Ministério
Público o vice-governador Paulo Octávio Pereira, dez deputados e
ex-parlamentares, secretários de Estado e autoridades. Em 20 de
setembro, no último despacho sobre o caso, o ministro relator
transformou o inquérito criminal 650 na ação penal 707, tornando os
acusados formalmente em réus. Eles responderão pelos crimes de corrupção
– ativa e passiva -, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha.
O dinheiro era desviado por meio de contratos, a maioria na área de
informática, com dispensa de licitação. Outro mecanismo consistia no
reconhecimento de dívidas relativas a serviços não realizados ou
superfaturados.
- Generosíssimos pagamentos eram feitos a diversas empresas, muitas
do setor de informática e, claro, em retribuição aos pagamentos, os
empresários e proprietários mantinham pagamentos regulares, mensais a
diversas pessoas do governo – explicou o procurador-geral da República,
Roberto Gurgel, quando entregou a denúncia, em junho.
A ação corre no STJ porque um dos acusados, o conselheiro Domingos
Lamoglia, do Tribunal de Contas do DF, tem direito a foro especial. Se
ele renunciar ao cargo, o caso desce para a Justiça Federal de primeira
instância, uma vez que nenhum dos demais réus tem prerrogativa de foro
especial. A denúncia demorou mais de dois anos a ser entregue porque o
MP, segundo Gurgel, teve de refazer quase todo o inquérito da PF, que
deixou de fora vários envolvidos no esquema, entre os quais os deputados
que aprecem em fitas de vídeo embolsando propinas.
Por ocasião da abertura do inquérito, em novembro de 2009, a
procuradora da República Raquel Dodge anexou 30 vídeos que revelam em
detalhes como funcionava a máquina de arrecadação e distribuição de
propina. O primeiro mostra Arruda recebendo R$ 50 mil das mãos de Durval
Barbosa, operador do esquema, que depois se tornou delator e terá
benefícios penais por isso.
Há fitas com acusados colocando dinheiro na cueca, nos bolsos, em
pastas e bolsas. O ex-presidente da Câmara Distrital Leonardo Prudente
aparece enfiando maços de dinheiro nas meias. O ex-corregedor da Casa
deputado Júnior Brunelli, que é pastor evangélico, aparece em outro
vídeo recebendo dinheiro e fazendo a oração da propina junto com Durval e
Prudente. A deputada Eurides Brito foi cassada depois do vídeo em que
põe dinheiro na bolsa.
A deputada federal Jaqueline Roriz, que aparece em um dos vídeos
recebendo maços de dinheiro de Durval, também depôs na terça-feira. Ela
disse que se tratava de recursos para ajuda de campanha e que não sabia
que a origem era ilegal.
Brasil Atual