Coronel teria dito a vizinhos que iria "mandar balas nos ladrões" se fosse assaltado
Julio Miguel Molinas Dias, 78 anos, foi morto na noite de quinta-feira quando chegava em casa
Militar reformado teria reagido a ação dos bandidos e cerca de 15 tiros foram disparados
Foto:
Jean Schwarz / Agencia RBS
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José Luís Costa
Em tempos de mobilização nacional em busca da verdade durante o longo
período da ditadura no Brasil (1964-1985), a Polícia Civil gaúcha está
diante de um crime que relembra um dos episódios mais sombrios do regime
militar. O desafio dos investigadores é esclarecer a morte do coronel reformado
do Exército Julio Miguel Molinas Dias, 78 anos, personagem que entrou
para história dos anos de chumbo como chefe dos militares responsáveis
pelo atentado ao Riocentro, três décadas atrás, no Rio de Janeiro.
O coronel foi assassinado quando chegava em casa às 21h de
quinta-feira, na Rua Professor Ulisses Cabral, bairro Chácara das
Pedras, em Porto Alegre, por razões ainda tão misteriosas como as
atividades dele à frente do Destacamento de Operações de Informações —
Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-Codi), na capital fluminense.
Viúvo, morando sozinho em um confortável sobrado na Rua Professor
Ulisses Cabral, Molinas Dias foi alvejado a tiros ao retornar de uma
visita a uma das filhas em um bairro vizinho. Investigações iniciais da
Polícia Civil indicam que o militar, armado com uma pistola, reagiu à
investida criminosa.
Mas os investigadores tentam descobrir por que um dos assassinos
estava no banco do carona do C4 do militar e por qual razão foram
disparados tantos tiros, cerca de 15
— três deles acertaram o coronel no tórax, no braço esquerdo e no
rosto, o tiro fatal. Nada teria sido levado a não ser uma pistola que o
militar portava. Uma bolsa de couro — com celular, óculos, relógios,
carteira e R$ 231 — ficou dentro do veículo da vítima.
Teria sido o coronel vítima de:
1) Uma armadilha de quem desejava se vingar dele?
2) Um roubo de carro malsucedido?
3) Uma tentativa de assalto à residência do militar?
— Não se descarta nenhuma dessas hipóteses — afirma o delegado Luís
Fernando Martins Oliveira, da 14ª Delegacia da Polícia Civil de Porto
Alegre, responsável pelo caso.
Pelo
menos em duas oportunidades, o coronel reformado do Exército comentou
com a vizinhança que andava sempre armado para defesa pessoal — tinha
pelos menos duas pistolas, um revólver e uma arma longa. Ao saber de uma
tentativa de roubo de carro nas imediações, garantiu que, com ele, isso
não aconteceria, pois iria "mandar balas nos ladrões".
Mas o cotidiano do militar indicava que ele não tinha inimigos.
Vivendo as últimas duas décadas em Porto Alegre, o coronel fez apenas
uma visita a uma delegacia da Polícia Civil, em junho, para o registro
de uma ocorrência do recebimento de uma multa indevida — um carro com as
mesmas placas do dele foi multado em Camaquã, cidade onde o militar
nunca esteve.
Embora fosse homem de poucas palavras, Molinas Dias era querido pelos vizinhos com os quais conversava, quando caminhava até a praça em frente à casa dele ou ao se exercitar em uma academia.
— Ainda ontem (quinta-feira) pela manhã abanou para mim quando ia
para a ginástica — lamentou, chorando, uma moradora do bairro Chácara
das Pedras.
O coronel foi sepultado na tarde desta sexta-feira no Cemitério
Jardim da Paz, em Porto Alegre. Na busca de pistas dos criminosos, a
polícia conta com a ajuda da população. Informações podem ser repassadas
pelo telefone de plantão da 14ª DP — (51) 3340.2299 — a qualquer hora
do dia.
O Caso do Riocentro
- O atentado ao Riocentro ocorreu por volta das 21h de 30 de abril de
1981, durante show comemorativo ao Dia do Trabalhador. Um explosivo
acabou detonando dentro de um Puma, onde estavam o sargento Guilherme do
Rosário, que morreu, e o capitão Wilson Machado, que sobreviveu com
graves ferimentos.
- Militares de extrema direita, descontentes com a abertura política
iniciada pelo general João Figueiredo (1979-1985), cometeram o malogrado
atentado no Riocentro. Queriam culpar grupos de esquerda, para causar
um retrocesso no regime. No entanto, houve uma trapalhada, a bomba
explodiu no colo do sargento Rosário.
- Ataques terroristas se multiplicavam pelo país, com bombas
destruindo bancas de revistas e sedes de jornais de esquerda, os
chamados "nanicos".
- Em agosto de 1980, uma carta bomba atingiu a secretária da Ordem
dos Advogados do Brasil (OAB) no Rio, Lyda Monteiro da Silva, que teve o
braço decepado e morreu no hospital. No mesmo dia, uma bomba foi
detonada na Câmara de Vereadores do Rio, ferindo seis pessoas.