Cantando em Cuba |
Em
entrevista, o ator fala do acordo com Gilmar Mendes, do vício em
internet, de liberdade, patrulha, TV Globo, homofobia e por que não
gosta do Facebook: “é muito família”
Para ilustrar essa entrevista, José de
Abreu enviou fotos inéditas de sua última viagem à Cuba, em abril de
2013. Aqui, o ator cantando na Bodeguita O que começou como uma
entrevista rápida, virou um jantar demorado e intenso, regado a vinho e
carne. Que se desdobrou em telefonemas, e-mails e mensagens via twitter e
celular.
Na última ligação, na noite de terça-feira 21, José de Abreu
avisava que tinha conseguido, finalmente, reatitwivar sua conta original
no Twitter (@zehdeabreu), com todos os 75 mil seguidores. O ator saiu
da rede social por conta do processo movido pelo ministro do STF Gilmar
Mendes –“resolvi recolher as armas”. Mas agora voltou. E, jura, voltou
mais calmo. “Pelo menos vou tentar não me pilhar tanto”.
No papo logo após uma apresentação da
peça Bonifácio Bilhões no último sábado, em São Paulo, o ator falou
longamente sobre como está na Internet desde os primórdios das BBS,
enumerou os sites que lê com mais frequência (“Viomundo, Nassif, Brasil
247, Maria Frô, Socialista Morena… e mais um monte de coisa”), reclamou
da gripe e também da patrulha que sofre na rede e desfiou elogios à
Globo e aos cãezinhos peludos da raça lhasa apso.
Atendeu prontamente aos pedidos de
fotografia de fãs e contou satisfeito que hoje, em meio aos inúmeros
pedidos pra tirar foto por conta de sua atuação na Globo, muitos o
assediam, todo dia, por causa da suas posições políticas na internet.
Falando em assédio, parece mentira, mas o taxista que nos levou até o
restaurante entrou no papo e não queria sair mais porque tinha sido
candidato a vereador pelo PT no interior de Sergipe e era fã do José de
Abreu versão político. E o taxista da volta, piauiense, comentou logo
após o ator descer do carro que ficou feliz em saber que “o Nilo da
novela gosta do Lula”. A seguir os melhores momentos da conversa:
Gilmar Mendes e saída do twitter
[O ministro do STF abriu processo contra
José de Abreu por injúria, calúnia e difamação por conta de um tuíte
que insinuava que ele teria contratado um espião preso na operação Monte
Carlo da PF. Um acordo foi fechado no último dia 12 de maio, e o
processo foi retirado.
O ministro já havia ameaçado processar Zé em
outra ocasião, quando o artista o chamou de “corrupto”]. “Fizemos um
acordo, mas não posso falar muito sobre isso porque a minha parte no
acordo consiste justamente em não falar mais dele publicamente. Depois
do processo, conversei muito com amigos e familiares, e resolvi guardar
as armas, então fechei minha conta no twitter”.
Volta ao twitter-droga
“Voltei hoje (ontem, terça feira, 21 de
maio) ao Twitter! Eu tinha suspendido minha conta por algumas semanas
resolvi reativar. Mas vou voltar mais clamo, vamos ver se consigo… Me
fez bem ficar de fora do twitter, eu observava, mas não estava exposto,
brigando. Foi bom… aquilo é um vício como outro qualquer, uma droga. Mas
droga não é necessariamente ruim… estamos aqui tomando um vinho, e é
legal, estamos conversando, combina com a comida etc. E facebook eu
nunca gostei muito, acho muito família, muita fotinho de filho… muito
light. Sou mais heavy, mais do twitter mesmo.
Patrulha na rede
“Tem alguns tuiteiros que me xingam
diariamente, muitas vezes de coisas pesadas. Já me chamaram de canalha,
homofóbico, filho da puta… falaram que minha mulher vai pra Ipanema dar
pra surfista… Porra, que é isso? Ficam me monitorando, me patrulhando, o
que não tem nada a ver com a própria lógica da rede.
Twitter é o
assobio de um passarinho, algo efêmero, que poderia até sumir depois de
umas horas. Não é algo pra durar, pra você imprimir, tirar do contexto e
registrar em cartório.
Um saco isso de ficarem atrás de mim. Qualquer
coisa que eu posto é exposta em tudo que é canto… tem estudante de
direito que semanalmente manda meus tuítes para a Procuradoria-Geral da
República e fica pedindo providencias. Você acredita? Tem outros dois
malucos fizeram um blog só pra isso, pra expor meus tuites com
comentários! Pô, são dedo-duros cibernéticos!” [risos]
Processo contra difamadores e liberdade na internet
“Acho que twitter é praticamente um
chat, algo libertário, como toda internet. Eu brigo? Claro, entro na
pilha, não me seguro e falo demais.
Mas já decidi: não vou processar
ninguém. Falei isso só pra dar um susto. Já me diverti bastante vendo os
babacas apavorados e “disfarçando”. Vivo de imagem, sou ator, esses
processos costumar sair caro pros caluniadores…
Mas repito: não vou
processar ninguém. Até porque sempre achei a internet muito libertária, e
deveria continuar assim. Se for pra ter lei de internet tinha que ser
pra dizer que não tem que ter lei. Ou vale só a Constituição e já tá bom
demais. Tem que ser um território livre. Sem adjetivos.”
Acusações de homofobia
[O ator foi acusado de preconceito por
ter se recusado a beijar um homem na boca em um bar]. “Homofóbico é
ótimo! Fiz o primeiro beijo homo do teatro brasileiro em O beijo da
Mulher Aranha, do Manuel Puig.
A primeira trepada homo ao vivo no teatro
brasileiro. E que foi cortada pela censura [mostra a imagem do
documento da censura no celular] mas que era desobedecida toda noite.
Fiz também o filme gaúcho
A Intrusa, baseado no conto homônimo do
Borges, com música do Piazzolla, onde havia um menàge com 2 homens e uma
mulher, e encerrava com um beijo na boca entre eles, que eram irmãos.
Foi um Brokeback Montain 30 anos antes! Porra, eu beijava homem na boca
em cima do palco antes desses caras que me acusam de homofobia
nascerem!”
Rede Globo nem aí
“A Globo acabou de renovar meu contrato
por 3 anos, como tem sido há décadas. Tive um aumento razoável e vou ser
o vilão-protagonista da próxima novela das seis.
Eu me expor dessa
forma como eu faço, me posicionar politicamente, acaba me valorizando
como artista. E a Globo nunca, nunca, me fez qualquer indagação sobre
meu posicionamento.
Conversei até com o antigo diretor geral, o
Florisbal, e ele me lembrou do Dias Gomes, do Oduvaldo Viana Filho — a
Grande Família é dele — e do Paulo Pontes, todos comunas que
trabalharam, e muito, na Globo. Tem aquela lenda que o Roberto Marinho
dizia teria dito pros milicos: “dos meus comunistas cuido eu”.
Não sei
se é verdade, mas teve uma época com muita censura e perseguição
política e a Globo começou a levar muitas boas cabeças pra lá, como
Paulo José, Hugo Carvana, Paulo Afonso Grisolli … O Projac é uma fábrica
de sonhos, não tem nada a ver com aquela meia hora diária de
noticiário…”
Candidatura a deputado federal
“Não vou sair candidato, já decidi.
Conversei com muita gente e achei melhor não sair, até porque eu teria
que sair da Globo e preciso do salário, pago duas pensões pra
ex-esposas, ajudo pessoas da família, gente que pede pela internet,
protetores de animais…”
Lhasa apso
“Olha tô falando sem demagogia, tenho
ajudado muito gato e cachorro hoje em dia, outro dia ajudei um que
apanhou tanto que tinha ficado sem a pele do rosto, só sobrou a arcada
dentária. Admiro pacas essas pessoas que dedicam sua vida a essa causa.
Tem muitos no tuinto. [E discorre em seguida sobre o lhasa apso que
aparece no vídeo que fez com Rafinha Bastos.
“No Tibete acreditavam que o
lhasa apso era reencarnação de monges, e sabe que ele te passa uma paz
grande mesmo?”].
Zé computer guy
“Eu sempre usei a internet, desde os
primórdios das BBS, passei por todas as fases, mIRC, ICQ e tudo mais.
Sempre adorei isso, meu primeiro computador foi um IBM-Aptiva. E eu
gostava tanto que até era o cara que montava o micro para os amigos.
Montei mais de 10.
E meu micro mesmo ficava todo aberto em cima de uma
mesa, as peças espalhadas, assim era mais fácil ir trocando.”
Sou o que sou
“Várias vezes eu penso, não deveria ter
escrito isso… mas vou lá e escrevo, não aguento, sou provocador, sou um
filho da puta… sou um artista!”
Fonte: Carta Capital