by bloglimpinhoecheiroso
Entre
2011 e 2012, 128.697 pessoas recorreram a estes bancos. Em 2012 e 2013,
a cifra quase triplicou: 346.992. Já há mais de 400 bancos de alimentos
no país.
Marcelo Justo, via Carta Maior
É
a sexta economia mundial, origem da Revolução Industrial, ex-império
que dominou o mundo tem cerca de 13 milhões de pessoas vivendo abaixo da
linha de pobreza. Com um duro plano de austeridade que está socavando
lentamente o Estado de Bem estar, salários estagnados, explosão do
emprego temporário e de meio turno, muitos têm que recorrer aos bancos
de alimentos das ONGs no Reino Unido.
A Fundação Trussell Trust
tem mais de 400 bancos de alimentos em todo o país. O impacto do
programa de austeridade aplicado pela coalizão de conservadores e
liberais democratas desde 2010 é claro. Em 2011-2012, 128.697 pessoas
recorreram a estes bancos. Em 2012-2013, a cifra quase triplicou:
346.992. “Há muita gente que come uma vez ao dia ou tem que escolher
entre comer e acionar a calefação em pleno inverno”, disse à Carta Maior
o diretor da Trussell Trust Chris Mould.
Os
especialistas medem a pobreza em termos absolutos (virtual incapacidade
de sobrevivência) e relativos (em relação à renda média e às
expectativas de uma época). Hoje em dia não ter uma geladeira é um
indicador de pobreza; em 1913, data de invenção da geladeira doméstica,
era um luxo. Segundo o Trussell Trust, um de cada cinco britânicos se
encontram hoje em situação de pobreza relativa ou absoluta. “É fácil
esquecer que se pode cair muito rápido nesta situação. Uma demissão, uma
conta muito alta de eletricidade, uma redução dos benefícios sociais,
um drama familiar e essas pessoas ficam sem nada”, explica Mould.
Esta
pobreza se estende para além do desemprego. A atual taxa de desocupação
de 7,7% (2,5 milhões de pessoas) encobre um panorama social complexo.
Quase 1,5 milhão de pessoas tem trabalhos de meio turno e com salários
baixíssimos que geraram o movimento pelo chamado “living wage” (salário
digno).
O
percentual de subempregados (que desejariam trabalhar mais se pudessem)
aumentou de 6,2% em 2008 para 9,9% hoje. “A maioria da ajuda estatal
não vai para os desempregados, mas sim para pessoas que estão
subempregadas ou têm salários muito baixos. Muitas vezes pela própria
instabilidade destes trabalhos as pessoas entram e saem de situações de
extrema necessidade”, diz Mould.
A
esta pobreza de receita se somam outras formas no Reino Unido, como a
chamada “pobreza energética” dificilmente visualizada na América Latina
seja pela diferença climática ou porque ainda não foi conceitualizada.
Este nível de pobreza afeta cerca de 3,4 milhões de pessoas (cerca de 6%
da população) que tem que gastar mais de 10% de suas receitas para
“manter um nível adequado de calefação” durante os cinco meses ou mais
de duração do inverno britânico. Muitos não têm escolha e deixam a
calefação desligada porque não podem pagar as contas.
Um caso particular
Uma
britânica que não pode ligar a calefação no inverno é Geraldine Pool,
de Salisbury, sudoeste da Inglaterra, diagnosticada com depressão,
divorciada, com um filho e sem trabalho. A Carta Maior conversou com
Pool, um caso típico do impacto devastador que a austeridade está tendo
em muitas vidas. “Em 2011 perdi meu trabalho em uma biblioteca pública
pelos cortes do governo. Desde então, busquei trabalho em administração,
supermercados, seja o que for, mas é muito difícil para alguém com mais
de 50 anos porque sempre preferem os mais jovens”, disse Pool.
O
Estado paga a ela 61 libras semanais (99 dólares) a título de seguro
desemprego e fornece assistência habitacional. “Não é suficiente. Se uso
a calefação, as contas sobem para quase 300 libras semanais”. Neste
momento não tenho água quente. Tenho que esquentar a água para me
lavar”, explica Pool.
Pool
tinha ouvido falar dos bancos de alimentos, mais foi por causa de sua
médica do Sistema Nacional de Saúde que acabou indo a um. “Não queria
recorrer a isso. Mas foi fundamental. Com os “vouchers” (vales) me deram
latas de carne, peixe, massa, leite, açúcar. Umas seis semanas depois,
no último Natal, tive um segundo pacote muito completo de alimentos”,
assinalou à Carta Maior.
Os
Bancos de Alimentos procuram trabalhar muito perto da comunidade e
funcionam com as contribuições voluntárias da população e, em muito
menor medida, de supermercados ou fazendeiros. “Cerca de 95% dos
alimentos que temos vem das pessoas a quem pedimos que adquiram dois
itens adicionais em um supermercado que sirvam para uma nutrição
balanceada”, informa Mould.
Os
bancos se conectam com figuras chave da comunidade em consultórios
médicos, hospitais, serviços sociais, igrejas e, em alguns casos, da
polícia que identificam as pessoas que podem necessitar estes vales para
ter acesso a um pacote de alimentos. Em um caso raro de sensibilidade
social, a polícia de Islington, no norte de Londres, não prendeu um
jovem que havia tentado roubar pão e ovos de um mercado, após passar
dias sem se alimentar direito. Quando a pessoa em questão, Adam, relatou
seu drama o levaram ao banco de alimentos onde, segundo o testemunho
dos próprios policiais, começou a chorar.
A
Trussell Trust calcula que necessitará uns “200 ou 300 bancos de
alimentos mais” para cobrir todo o Reino Unido, mas é consciente que,
com toda sua boa vontade, funciona como um paliativo: necessário, muito
útil, mas insuficiente. “Nós intervimos nestes momentos de emergência e
se for necessário ampliamos nossa assistência. Mas o que é preciso é uma
política social para o emprego, a habitação, salários dignos e
estímulos ao crescimento. Devido a todos os cortes que ocorreram,
estamos inundados de trabalho”, apontou Mould à Carta Maior.
Tradução: Marco Aurélio Weissheimer.