Folha enganou e escondeu provas! E o MP?
publicado
21/07/2016
A fraude jornalística da Folha é ainda pior: surgem novas evidências
Dados de pesquisa ocultados pela Folha
mostram que a grande maioria dos eleitores quer a renúncia de Temer, o
que contradiz categoricamente a matéria da Folha
* 62% dos brasileiros querem a renúncia
de Dilma e Temer, e a realização de novas eleições: ao contrário dos 3%
inicialmente mencionados pela Folha
* Dados cruciais da pesquisa foram publicados e, em seguida, retirados do ar pelo datafolha: encontrados por portal brasileiro
* Resposta do Diretor Executivo da
Folha de São Paulo de que os dados ocultados não eram “jornalisticamente
relevantes” não resiste a análise
NA QUARTA-FEIRA (20), a Intercept
publicou um artigo documentando a incrível “fraude jornalística”
cometida pelo maior jornal do país, Folha de São Paulo, contendo uma
interpretação extremamente distorcida das respostas dos eleitores à
pesquisa sobre a crise política atual. Mais especificamente, a Folha –
em uma manchete que chocou grande parte do país – alegava que 50% dos
brasileiros desejavam que o presidente interino, e extremamente
impopular, Michel Temer, concluísse o mandato de Dilma e continuasse
como presidente até 2018, enquanto apenas 3% do eleitorado era favorável
a novas eleições, e apenas 4% desejava que Dilma e Temer renunciassem.
Isso estava em flagrante desacordo com pesquisas anteriores que
mostravam expressivas maiorias em oposição a Temer e favoráveis a novas
eleições. Conforme escrevemos, os dados da pesquisa – somente publicados
dois dias depois pelo instituto de pesquisa da Folha – estavam longe de
confirmar tais alegações.
Depois da publicação de nosso artigo,
foram encontrados ainda mais indícios – através de um trabalho
colaborativo incrível de verdadeiros detetives da era digital – que
revelam a gravidade da abordagem da Folha, incluindo a descoberta de um
legítimo “smoking gun” comprovando que a situação era muito pior do que
achávamos quando publicamos nosso artigo ontem. É importante não deixar o
aspecto estatístico e metodológico encubra a importância desse
episódio:
Semanas antes da conclusão do conflito
político mais virulento dos úlitmos anos – a votação final do
impeachment de Dilma no Senado Federal – a Folha, maior e mais
importante jornal do país, não apenas distorceu, mas efetivamente
escondeu, dados cruciais da pesquisa que negam em gênero, número e grau a
matéria original. Esses dados demonstram que a grande maioria dos
brasileiros desejam a renúncia de Michel Temer, e não que o “presidente
interino” permaneça no cargo, como informado pelo jornal. Colocado de
forma simples, esse é um dos casos de irresponsabilidade jornalística
mais graves que se pode imaginar.
A desconstrução completa da matéria da
Folha começou quando Brad Brooks, Correspondente Chefe da Reuters no
Brasil, observou uma enorme discrepância: enquanto a Folha anunciava em
sua capa que apenas 3% dos brasileiros queriam novas eleições e que 50%
queria a permanência de Temer, o instituto de pesquisa do jornal,
Datafolha, havia publicado um comunicado à imprensa com os dados da
pesquisa anunciando que 60% dos brasileiros queriam novas eleições.
Observe essa impressionante contradição:
Como isso é possível? Nós entramos em
contato com o Datafolha imediatamente para esclarecer a dúvida, mas como
grande parte dos veículos de comunicação já havia lido nosso artigo e o
assunto havia se tornado uma controvérsia nacional, o instituto se
recusou a se manifestar. Eles simplesmente não queriam nos explicar a
natureza da discrepância.
Mas essa revelação levou a outro
mistério: nos dados e perguntas complementares publicados pelo
Datafolha, não havia nenhuma informação mostrando que 60% dos
brasileiros eram favoráveis a novas eleições, como dizia um dos
enunciados da pesquisa do instituto. Parecia evidente que o Datafolha
havia publicado apenas algumas das perguntas feitas aos entrevistados.
Apesar das perguntas estarem numeradas, o documento contava apenas com
as perguntas 7-10, 12-13 e 21. Isso não é necessariamente incomum ou
incorreto (jornais tendem a omitir perguntas sobre tópicos menos
relevantes ao publicar uma reportagem), mas era estranho que nenhuma das
perguntas publicadas pelo Datafolha confirmasse ou tivesse relação com a
afirmação do enunciado da pesquisa. De onde, então, saiu essa
informação – 60% – que contradiz a reportagem de primeira página da
Folha?
A resposta veio através do excelente
esforço investigativo de Fernando Brito do site Tijolaço. Primeiro, a
equipe do site observou que o endereço URL do documento do Datafolha com
os dados e perguntas complementares à pesquisa que foi publicado na
segunda-feira – documento citado em nosso artigo original mostrando que a
manchete da Folha era falsa – terminava em “v2”, ou seja, era a segunda
versão do documento publicado pelo Datafolha. A equipe procurou a
versão original, mas não foi possível encontrá-la no site do instituto.
Eles começaram a tentar adivinhar o endereço URL da versão original, até
que acertaram. Embora a versão original tivesse sido retirada do ar
pelo Datafolha, ainda se encontrava nos servidores do instituto, e ao
acertar o endereço URL correto o Tijolaço teve acesso ao documento.
O que foi encontrado na versão original
do documento – aparentemente retirada do ar de forma discreta pelo
Datafolha – é de tirar o fôlego. Ficou comprovado que a matéria da Folha
era uma fraude jornalística completa. A pergunta 14, encontrada na
versão original, dizia:
“Uma situação em que poderia haver
novas eleições presidenciais no Brasil seria em caso de renúncia de
Dilma Rousseff e Michel Temer a seus cargos. Você é a favor ou contra
Michel Temer e Dilma Rousseff renunciarem para a convocação de novas
eleições para a Presidência da República ainda neste ano?”
Os dados não publicados pelo Datafolha
mostram que 62% dos brasileiros são favoráveis à renúncia de Dilma e
Temer, e à realização de novas eleições, enquanto 30% são contrários a
essa solução. Isso significa que, ao contrário da afirmação da Folha de
que apenas 3% querem novas eleições e 50% dos brasileiros querem a
permanência de Temer como presidente até 2018 – ao menos 62% dos
brasileiros, uma ampla maioria, querem a renúncia imediata de Temer.
A situação é ainda pior para a Folha (e
Temer): a porcentagem de eleitores que deseja a renúncia imediata de
Temer é certamente muito maior do que esses 62%. A pergunta colocada
pelo Datafolha era se os entrevistados eram favoráveis à renúncia de
Temer /e Dilma/. Muitos dos que responderam “não” – conforme demonstrado
pelos detalhes dos dados – são apoiadores do PT e/ou querem Lula como
presidente em 2018, o que significa responderam que “não” porque querem
que Dilma retorne, e não porque querem a permanência de Temer. Portanto –
conforme concluído pelo Ibope em abril – apenas uma minoria dos
eleitores querem Temer como presidente: exatamente o oposto da
“informação” publicada pela Folha.
Essa não foi a única informação ausente
que o Tijolaço descobriu quando encontrou a primeira versão dos dados
publicados. Como explicam de maneira detalhada, havia dois parágrafos
inteiros escritos pelo DataFolha resumindo os dados das respostas que
também foram removidos da segunda versão publicada, inclusive a seguinte
frase: “a maioria (62%) declarou ser a favor de uma nova votação para o
cargo de presidente”
A equipe também descobriu uma pergunta
não revelada – a pergunta 11 – que é provavelmente a mais favorável a
Dilma e foi completamente omitida pela Folha. O DataFolha perguntou:
“Na sua opinião, o processo de
impeachment contra a presidente Dilma Rousseff está seguindo a regras
democráticas e a Constituição ou está desrespeitando as regras
democráticas e a Constituição?”
Apenas 49% disseram que o impeachment
cumpre as regras democráticas e respeita a Constituição, enquanto 37%
disseram que não. Como a Folha pode omitir este dado tão surpreendente e
importante quando, supostamente, quer descrever a visão dos eleitores
sobre o impeachment?
Ontem, a Folha publicou uma “notícia”
sobre o que chamou de “controvérsia” provocada por nosso artigo. O
jornal se esquiva e, em muitos casos ignora a maioria destas questões
importantes.
O artigo confirma que, ao contrário de
sua afirmação anterior de que apenas 3% dos brasileiros querem novas
eleições, “a porcentagem de favoráveis a novas eleições, no entanto,
sobe para 62% nas respostas estimuladas, ou seja, quando o instituto
pergunta explicitamente”. E incluiu as duas perguntas que havia mantido
em segredo: uma demonstrando que a maioria quer a saída de Temer, e
outra mostrando uma expressiva minoria que vê o impeachment como uma
violação da democracia (a Folha deixou de mencionar que estes novos
dados, na verdade, haviam sido publicados anteriormente pelo Tijolaço).
No entanto, o jornal insistiu que não
havia nada de errado em esconder esses dados. Publicaram uma citação do
próprio editor executivo, Sérgio Dávila, argumentando que é
“prerrogativa da Redação escolher o que acha jornalisticamente mais
relevante no momento em que decide publicar a pesquisa”. Dávila insistiu
que “o resultado da questão sobre a dupla renúncia de Dilma e Temer não
nos pareceu especialmente noticioso, por praticamente repetir a
tendência de pesquisa anterior e pela mudança no atual cenário político,
em que essa possibilidade não é mais levada em conta.”
Não se pode subestimar a desonestidade dessa resposta e quanto o editor executivo da Folha conta com a ingenuidade de seus leitores. O maior absurdo da reportagem da Folha foi
dizer que o país deseja a permanência de Temer como presidente até 2018
e apenas uma pequena porcentagem quer novas eleições. Mas, ao mesmo
tempo em que publicava isso, a Folhatinha em mãos os dados que
provam que essas afirmações eram 100% falsas, mostrando que, na
realidade, o oposto era verdadeiro. A grande maioria dos brasileiros
querem que Temer saia do poder, e não que o interino permaneça como
presidente. E uma expressiva maioria, não uma parcela ínfima, quer novas
eleições.
Nenhuma das desculpas de Dávila resiste
sequer ao menor questionamento. Se é jornalisticamente irrelevante
saber a porcentagem de brasileiros favoráveis a novas eleições, por que
a Folha encomendou a pergunta? Se essa pergunta sobre novas
eleições é irrelevante, por que esse dado foi não apenas incluído, mas
proeminentemente destacado pelo Datafolha no título do relatório
original? Por que, se esse dado é irrelevante, o Datafolha o publicou
originalmente e depois o retirou do ar em nova versão que excluía essa
informação? E como esse dado pode ser considerado jornalisticamente
irrelevante pela Folha quando ele contradiz diretamente as afirmações alardeadas na capa do jornal e, em seguida, reproduzidas pelos maiores jornais do país?
Outros meios de comunicação também
consideraram esses dados relevantes. Ontem à noite, a edição brasileira
do El País publicou um artigo de destaque com a manchete: “62% apoiam
novas eleições, diz dado que Datafolha publica agora”. O El País aborda o
ocorrido tanto como um escândalo jornalístico, quanto político,
descrevendo como a Folha escondeu esses dados até serem
encontrados em consequência de nosso artigo. O jornal também publicou
outra matéria citando especialistas que corroboraram as posições de
nossos entrevistados, criticando veementemente a Folha pelo uso impróprio dos dados da pesquisa.
Fica extremamente óbvio o que realmente
aconteceu: a Folha de São Paulo fez alegações falsas sobre as questões
políticas relevantes do país e, além disso, sabiam que eram falsas
quando as publicou. A Folha tinha em mãos os dados que comprovam a
falsidade das alegações, mas optou por efetivamente escondê-las de seus
leitores. Ou melhor, alguém decidiu por tentar retirá-los da Internet.
O mais surpreendente é que todo esse
esforço foi feito para negar o desejo de democracia: fazendo o país
acreditar que a maioria dos brasileiros apoiam a figura política que
tomou o poder de forma antidemocrática e que não há necessidade de
realizarem-se novas eleições, quando a verdade é que a maioria do país
quer a renúncia do “presidente interino” e a realização de novas
eleições para escolha de um presidente legítimo.
Conforme dissemos ontem, é impossível estabelecer se a Folha agiu
de forma proposital com o intuito de enganar seus leitores ou com
extrema incompetência e negligência jornalísticas – embora as evidências
sugerindo aquela possibilidade sejam mais abundantes hoje que ontem.
Motivos à parte, é indiscutível que a Folha essencialmente enganou seus
leitores no que diz respeito a questões políticas cruciais e escondeu
provas fundamentais apenas publicadas após serem pegos em flagrante.