Um cabo da PM conta como os confrontos e abusos
nos protestos repercutem na corporação.
“Houve abuso” |
Um cabo da PM com 13 anos de serviço falou ao Diário sobre os abusos
que resultaram numa batalha campal na quinta-feira, em São Paulo. Por
motivos óbvios, pediu para não ser identificado. “Os chefes dão a ordem,
o soldado as cumpre e se, futuramente, isso resultar em
responsabilização para o soldado, quem deu a ordem se esquiva e o
subordinado é punido. Ou seja, o autoritarismo começa dentro dos
quartéis e resulta no que vemos nas ruas nestes últimos dias”, diz.
Como a maioria dos seus colegas vê o comportamento da PM?
Sinceramente, muitos não têm discernimento para entender o que é
manifestação e acabam generalizando tudo como vandalismo. Muitos são
enviados aos locais de manifestação contra sua vontade e acabam ficando
contra os manifestantes naturalmente. É uma situação complicada, pois
apenas cumprem ordens como: “Não deixem ninguém passar por aqui, façam
as pessoas se dirigirem para este ou aquele lado”.
Houve abuso?
Houve. A ordem vem de cima para coibir, mesmo. Só que, quando vão a público, o secretário e o governador mudam o discurso.
E as prisões de gente que andava com vinagre?
É assim mesmo, é ordem. Muitos daqueles policiais têm menos de cinco
anos de serviço, são recrutas e cumprem qualquer ordem à risca.
O Alckmin é fraco, o secretário de “Insegurança” é fraco, o comando da PM é mais fraco ainda
e mostra despreparo para essas situações. A tropa de choque serve para
isso: encerrar qualquer tipo de conversa e descer a borrachada no povo.
Havia policial não treinado usando armas de borracha?
Não, o policial que porta essa arma deve ser bem treinado, pois ele
cumpre uma função inicial de dar proteção para aqueles que ficam em
linha com os escudos e, num segundo momento, inibir qualquer ato hostil
por parte de manifestantes. A orientação é somente atirar se esse ato
hostil vier a se concretizar – como, por exemplo, alguém arremessar
pedras ou qualquer objeto que possa causar risco à integridade dos
demais policiais. Em suma, essa é a função desse policial atirador.
Não é todo PM que pode manusear esse tipo de arma. É dada preferência
aos mais experientes e após muito treinamento. No curso, aprendemos que
só pode utilizá-la quando houver risco à integridade física de algum PM
ou civil, e da linha da cintura para baixo. Embora seja de borracha, se
ela atingir determinada área da cabeça pode matar.
Dá para concluir que, se ele é treinado e atirou no olho da pessoa, foi intencional?
Sim, foi intencional. Uma viatura passou e atirou contra os
repórteres que estavam em um estacionamento, contrariando toda norma de
procedimento sobre o uso da munição de borracha (tecnicamente, chama- se
munição de elastômero; ele passou o endereço de um site com informações
sobre a bala: http://www.cbc.com.br/cartuchos-cal-12-de-uso-policial-subcat-9.html).
Por que atirar contra jornalistas?
Penso que foi um ato intimidatório, não tem outra justificativa.
Sabiam que eram jornalistas? Os policiais têm alguma prevenção?
No geral, não. Temos boa convivência com a imprensa. Se foi um ato despropositado contra os jornalistas, foi um ato isolado.
Como será a atuação da PM na segunda-feira?
Ficaremos de prontidão. Caso haja necessidade, a PM será enviada aos locais de manifestação.