A Previdência Social que está prestes a comemorar 95 anos no
dia 25 de janeiro. Perdeu o rumo nos governos do PT/PMDB, perdeu os
anéis com Lula/Dilma e os dedos com Temer. Perdeu o fôlego de oferecer
futuro, esperança, segurança e tranquilidade aos brasileiros. Mesmo
assim tem o que comemorar. Temos uma Previdência capaz de resistir à
sanha demolidora do mercado, de Temer, dos especuladores e de seus
algozes
Paulo César Régis de Souza*
A inflação está sob controle, as famílias estão conseguindo comer com
o pouco que ganham, o nível médio de remuneração do trabalhador privado
e do servidor público está em queda, os preços administrados sobem
quando querem (energia, gasolina, álcool e gás), o dólar está estável, o
PIB não ata nem desata, os investimentos externos entram para ganhar na
especulação financeira e vão embora, a bolsa navega na volatilidade do
céu de brigadeiro, o emprego não cresce.
A popularidade do presidente da República atingiu os mais baixos
níveis desde que começou a ser medida e a credibilidade das instituições
republicanas, como o Supremo, STJ, TSE, Senado e Câmara dos Deputados,
desce a ladeira, a respeitabilidade dos políticos e da elite empresarial
(indústria, comércio, agronegócio, transportes) está na lata do lixo. O
povo ainda confia na igreja, nos militares, em parte da mídia, nos
magistrados, nos membros do Ministério Público.
Este é o panorama visto do alto.
Aqui na terra, o desconforto é grande.
A educação está difícil de acertar. Não se ouviu um só protesto
diante da infâmia de convocar um Enem para 10 milhões de jovens quando
há 100 mil vagas nas universidades púbicas. Isto é coisa dos piores
países da África e da América Latina. A saúde está indo pelo mesmo
caminho: milhões de brasileiros diariamente procuram hospitais, médicos e
remédios nos 5.700 municípios do país e pouco encontram. Mas o negócio
do seguro saúde vai bem, obrigado.
Os transportes urbanos, ônibus e trens, que levam e trazem milhões de
pessoas diariamente vivem em estado de calamidade permanente, apesar
dos bilhões pagos em subsídios pelos governos, que exigem apoio em
eleições e de outros bilhões, obrigatoriamente investidos em vias
púbicas, acessos, viadutos, pontes, estações que duram de uma eleição a
outra.
Mas o que me preocupa mesmo é o futuro da Previdência Social que está prestes a comemorar 95 anos no dia 25 de janeiro.
A Previdência perdeu o rumo nos governos do PT/PMDB, perdeu os anéis
com Lula/Dilma e os dedos com Temer. Perdeu o fôlego de oferecer futuro,
esperança, segurança e tranquilidade aos brasileiros. Mesmo assim tem o
que comemorar.
Temos uma Previdência Social capaz de resistir à sanha demolidora do mercado, de Temer, dos especuladores e de seus algozes.
O INSS tem 60 milhões de segurados contribuintes e 27 milhões de
segurados beneficiários, aposentados e pensionistas. Segue sendo a
segunda maior receita da República, a maior seguradora social da América
Latina, compõe o maior sistema de redistribuição de renda do país. Em
95 anos, nunca atrasou pagamentos, mesmo nos momentos mais turbulentos.
Os ativos dos fundos de pensão, com R$ 750 bilhões, e dos planos de
Previdência, com outros R$ 750 bilhões, mais de R$ 1,5 trilhão, estão a
serviço não da política social, mas da fiscal.
Em 50 anos, a Previdência Social preconizada por Eloy Chaves – com as
caixas e os institutos – foi orgulho de todos os brasileiros, com um
sistema completo de proteção social, com o regime de repartição simples
(os trabalhadores de hoje financiam os de ontem). O seu fundamento nº 1
era de que o sistema é contributivo. O fundamento nº 2, não existe
benefício sem contribuição.
Quando as entradas foram maiores que as
saídas, foi possível financiar Volta Redonda, Vale do Rio doce e
Brasília, construir uma rede de hospitais, ambulatórios, casas
populares, atendimento de urgência e restaurantes populares. Nessa
época, o empresário que não pagasse a sua parte ou descontasse e não
recolhesse a parte do trabalhador, perdia seus bens.
Depois vieram as preocupações com o desvio de recursos para
pagamentos de aposentadorias e pensões de trabalhadores rurais com pouca
ou nenhuma contribuição. Os dois fundamentos foram fraudados, com
consequências graves. Vieram as renúncias da contribuição patronal
inicialmente para as “pilantrópicas” da saúde e da educação.
Vieram
prazos e condições favoráveis para os caloteiros, inadimplentes. Os
trabalhadores perderam seus hospitais e a saúde (inclusive a
reabilitação profissional) e foram atirados à vala comum do Sistema
Único de Saúde. Até assistência social do INSS, limitada aos idosos sem
renda e a pessoas com necessidades especiais, foi levada para um
Ministério, inicialmente com recursos dos trabalhadores urbanos.
Como vocês estão vendo, a Previdência Social prestou inestimáveis serviços ao país apesar das fraudes que a abalaram.
As cinco gerações de servidores, antes do computador, quando tudo era
feito à mão, travaram guerra sem quartel contra a corrupção, geralmente
internalizada por políticos que agiam de má fé. Essas gerações
avançaram muito com o computador para eliminar fraudes. É histórica a
revisão de benefícios rurais em 1922, quando foram cassados 4 milhões
deles fraudados.
Lamentavelmente tivemos uma reforma da Previdência com FHC, duas
reformas com Lula, que para agradar o mercado e reduzir o déficit se
fizeram sobre os benefícios, cortando privilégios, e se esqueceram de
mexer no financiamento para não incomodar bancos e empresários. Não
funcionou.
E por que as reformas de FHC Lula não deram certo? Porque não se
mexeu no financiamento. As despesas cresceram e as receitas caíram. Os
benefícios aos caloteiros púbicos e privados se acentuaram, construindo
uma dívida administrativa, dentro da Receita, e ativa, dentro da AGU,
depois na PGFN, que cresceu exponencialmente.
Em relação ao financiamento, o que houve? FHC inventou o fator
previdenciário como instrumento de redução do déficit e ampliou o
déficit com renúncias para o agronegócio. Lula incorporou a Receita
Previdenciária à Receita Federal, com perversas consequências. Era uma
exigência do mercado. Dilma atendeu o mercado, implantou a desoneração
da folha.
Com o Temer, o mercado pediu e ele acabou de vez com o Ministério da
Previdência Social e mandou o INSS para o Ministério de Combate à Fome
com um ministro virtual.
Levou todo o dinheiro da Previdência para o
Tesouro e a Receita a fim de fazer o ajuste fiscal, impôs a
Desvinculação da Receita da União ao INSS, promoveu a farra dos Refis,
beneficiando todos os caloteiros e trombeteou uma nova reforma, sem
mexer no financiamento.
A Previdência Social resiste, com seus servidores, apesar da omissão
das elites e da ignorância dos trabalhadores, espera sobreviver e chegar
aos 100 anos.
* Paulo César Régis de Souza – é vice-presidente Executivo da
Associação Nacional dos Servidores Públicos, da Previdência e da
Seguridade Social (Anasps).